.
O jovem brasileiro assassinado pela polícia britânica em 2005 transformou-se em Selton Mello. Jean Charles, que entra em cartaz no Brasil na sexta-feira 26, tira da própria personalidade do ator, o mais requisitado do cinema nacional, o espírito de seu personagem. O eletricista que deixou uma pequena cidade mineira para arriscar a sorte no cinza londrino ganhou, no filme, os trejeitos humorísticos e o olhar levemente triste de Mello.
O diretor Henrique Goldman, talvez pela pouca experiência na ficção, deixou-se levar pelo ator, que, apesar do inegável talento demonstrado em filmes como O Auto da Compadecida (2000) ou Lavoura Arcaica (2001), tende a repetir suas artes e manhas quando deixado à solta. É o que acontece em Jean Charles.
Exatamente por isso, o que o filme tem de mais interessante está, ironicamente, nas figuras e cenas que rodeiam o protagonista, e não no personagem de Jean. Para recuperar o episódio, Goldman, documentarista radicado em Londres há quase duas décadas, e o roteirista Marcelo Starobinas debruçaram-se sobre uma comunidade imensa e invisível: a dos brasileiros residentes da cidade.
Nas pequenas histórias que rodeiam a “grande história” fatal estão os acertos desse filme que, preso aos fatos amplamente divulgados, não alça o voo que se espera da ficção. Não por acaso, é das frestas documentais que ele tira seu frescor. Os imigrantes vivendo seus próprios papéis, como uma das primas e o ex-chefe do eletricista, e os detalhes cotidianos das ruas escapam aos lugares-comuns da história, em geral, narrada de forma linear, armada para dar dramaticidade ao desfecho.
Construído de forma a “celebrar a vida”, como têm dito os autores, o roteiro atinge o ponto alto após o brutal assassinato no metrô. A cena em que os primos de Jean (vividos por Vanessa Giácomo, muito bem, e Luis Miranda) são levados a uma sala da polícia londrina para receber a notícia é construída com uma mistura de frieza e emoção que, em segundos, capta o drama daqueles cidadãos pela metade, incapazes de entender o significado da palavra morgue, necrotério, em inglês.
Coproduzido por Stephen Frears, diretor de A Rainha, e Rebecca O’Brien, sócia de Ken Loach (de Terra e Liberdade), Jean Charles, em tese, inclui-se na vertente social do cinema britânico. Goldman, no entanto, ao contrário de Frears e Loach, não parece compreender, na plenitude, o drama dos homens que se sentem fora de lugar.
(Ana Paula Sousa - www.cartacapital.com.br)
terça-feira, 23 de junho de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário é muito bem vindo.