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A foto na Folha de quarta-feira passada, mostrando a montanha de garrafas plásticas nas imediações de uma usina em São Paulo, em associação com os permanentes alagamentos da cidade, faz perguntar se o ser humano está apto a viver em cidades, ou se deveria ter continuado no mato, ainda empoleirado nas árvores e comendo bananas.
Se, para viver na cidade, o homem tem de cimentar, asfaltar e calafetar cada centímetro de terra e vegetação; se não pode deixar um metro de rio a céu aberto, precisando fazê-lo correr dentro de um canal debaixo da rua; e se se esmera em entupir e obstruir as saídas pelas quais a água de chuva teria alguma chance de escoar -enfim, com tudo isso, não sei como cidades ocupadas de tal forma podem ter recebido o selo de "habite-se".
Até o começo do século 20, o homem manteve uma relação razoável com a cidade. Claro, desde sempre a pobreza, a dissipação, as zonas de pestilência e outras mazelas foram características dos grandes aglomerados urbanos. O próprio contato entre as cidades era um risco: um navio que saiu de New Orleans infestado de febre amarela, em 1849, contaminou por décadas todas as cidades em que aportou, inclusive o Rio. O que fazer? Fechar os portos, as fronteiras? Já era impossível. Ou debelar a doença? Ainda não havia medicina suficiente.
A relação homem/cidade deixou de ser razoável quando entrou na história o automóvel. As cidades passaram a ser planejadas em função dele, cujas exigências conseguem ser ainda mais grosseiras e brutais que as do ser humano. Fizemos das cidades o nosso grande paradoxo: um cenário cujo conforto será maior quanto mais o ambiente for destruído.
Se o homem é inviável na urbe, como o paulistano bem sabe, também não é viável no mato, como provam as serras do Rio.
Desconfio que o problema seja o homem.
(Ruy Castro - http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1701201105.htm)
segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
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