De tempos em tempos somos obrigados a suportar a crítica disseminada nas ruas de que não sabemos votar. Há verdade nisso. Mas há, também, uma distância abissal entre o gesto e a intenção de quem a patrocina.
Em outra direção, mas no mesmo eixo, freqüentemente somos provocados com a cantilena de que não brigamos por nossos direitos de cidadão republicano, enganosamente entoada por políticos com o jeitão de quem se julga sabedor de todas as respostas, mas que nunca lhes fora feita uma pergunta.
Intimidados diante da dureza lúcida com que situações como estas nos atingem, preferimos nos calar mais uma vez, remoendo a imortal citação de Bertolt Brecht: "...arrancam-nos a voz da garganta...".
Se o silêncio coletivo, como elemento cognitivo emocional das pessoas de bem, é um bom conselho para que fiquemos longe da truculência do sistema face aos pseudos "meios de defesa" que nos oferecem é, também, um alerta ao mesmo de que para tudo há um limite.
Uma reflexão mais profunda sobre esse comportamento aponta, na essência, para a deterioração do tecido social diante da falência múltipla das instituições de poder, e adverte para os riscos da exacerbação, dos repetidos abusos, do usufruir só para si o que é direito de todos, cuja contaminação em escala parece irreversível.
A ideia de ser ampliada a esfera de proteção da sociedade através da Lei Ficha Limpa, apostando no trabalho de setores do Judiciário como ajuda presumidamente eficiente para o aperfeiçoamento dos outros poderes, pareceu atender as melhores das intenções. No entanto, ainda que sustentada por eloquentes retóricas, a teoria não concorreu ao aprimoramento da ação.
Como em tantos outros casos, se contamos com a adesão dos nossos "nobres" parlamentares, ainda desta vez, só podemos lamentá-la como contribuição demagógica, dispensável, se não enganosa.
Como canibais servido-se com talheres, tantos são os que se utilizam exatamente das ferramentas escusas da lei que lhes estão à disposição para justificar suas atitudes absolutamente execráveis. Afinal, o que é preciso para ter-se a ficha suja?
Em um país onde ser cidadão --republicano ou não-- é sintoma de inferioridade e quem age dentro da lei é babaca ou idiota. Já passou da hora da sociedade, no seu verdadeiro formato, alvejada em cheio pelos atos dos políticos, de reagir e atuar de maneira a incomodar os responsáveis por esta pandemia virulenta de impunidade que se instalou sob a tutela das "liberdades democráticas".
Talvez devêssemos começar a atuar, adotando e estendendo à todas as instâncias do Governo. A opinião do secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, que numa frase extremamente oportuna, escancarou para o mundo a mazela do país, deixando em pânico geral a curriola do governo que, ao tentar reagir, teve de atropelar inclusive alguns ordenamentos consagrados em leis infraconstitucionais.
Os tempos são outros, dirão os divergentes, podendo com toda razão acrescentar que não foram treinados em casa e nem aprenderam na escola, enterrando ainda mais o dedo na própria ferida do comportamento ético e moral, deixando para os saudosistas a inesquecível marca de uma política decente e uma sociedade saudável, alimentados com a esperança de vê-las novamente, ou pela primeira vez nas ruas.
Em contraponto àqueles, ressuscito Brecht: "ao rio que tudo arrasta diz-se que é violento, ninguém chama violentas as margens que o comprimem".
(Carlos Roberto Vieira da Costa - Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/paineldoleitor/meuolhar/1059637-quem-age-dentro-da-lei-e-babaca-ou-idiota-reflete-leitor.shtml)
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