Naquela floresta, como em todas as florestas dos contos, reinava o leão. Como rei, não era de ficar zanzando pela floresta. Afinal, uma realeza que se preze, tem de manter uma certa distância dos súditos e da plebe. Raramente, sua alteza, o Leôncio, fazia uma aparição na praça principal, onde havia uma grande árvore – a mais frondosa e imponente de todo o reino.
A vida corria dentro da normalidade. Certo dia, dona arara, repórter local, chegou ao seu escritório, em um galho privilegiado (de onde podia saber tudo a respeito da vida de todos) da árvore central. Começava a preparar a pauta do dia, quando notou algo diferente no galho vizinho: muito bem estabelecido, de mala e cuia, estava ali um jabuti.
Após a edição daquele dia do jornal das oito, a curiosidade e a apreensão com o novo habitante do reino começou a tomar conta de todos. Alguns, curiosos por saber o que ele estava fazendo ali; outros, indignados porque ali não era lugar para um jaboti passar o tempo inteiro sem fazer nada.
Aos poucos, a sociedade foi se acostumando com a presença enigmática do cascudo:
- O urubu, com as piores intenções possíveis, começou a frequentar o galho para ficar horas e horas de papo com o jabuti.
- A arara, por sua vez, acabou gostando do vizinho. Na falta de pauta para o jornal, tinha sempre um assunto.
- As cobras começaram a nutrir inveja silenciosa. Um dia, aquele lugar na árvore havia de ser seu.
- Formigas continuaram a carregar suas folhinhas para lá e para cá, sem tempo para ficar especulando.
- Os macacos, quando não tinham nada para fazer, passavam na árvore, para tomar um café e bater um papo.
- O hipopótamo olhava para cima, pensava um pouco e lembrava-se que o galho da árvore não era coisa para ele.
- A dona coruja… essa só observava mesmo, com a atenção e a discrição que todo mundo conhecia.
Quem não se acostumou, foi o cão. Com a seu instinto canino, achava que aquele animal fora de lugar, sem função alguma, desequilibrava o ecossistema. Bicho errado no lugar errado, sem nada para fazer, é um perigo. Cedo ou tarde, dá confusão.
Começou, então, a sua cruzada particular: latia insistentemente, pulava balançava a árvore, a fim de desestabilizar o invasor. Em tentativas desesperadas, tentou até alianças com urubus e macacos – sem sucesso. Nada abalava o jabuti.
De repente, apareceu o rei Leôncio. Perguntou ao cão o motivo daquela algazarra. O cão começou a expor seus motivos, mas não chegou a terminar. Foi abrupta e violentamente interrompido pela pata pesada e afiada do rei. Em seguida, a revelação aterradora e uma sentença:
“Chega! Quem colocou o jabuti na árvore fui eu – e tenho meus motivos. Quanto a você, inconveniente, não há mais lugar para você nessa floresta. Vá embora e não volte nunca mais!”.
Manco de uma perna, o cão saiu com o rabo entre as pernas, sob os olhares apreensivos e curiosos de todos. Nunca mais pôde voltar. Quanto ao jabuti… por que você quer saber? É melhor não incomodá-lo – não faz bem para a saúde.
Daquele dia em diante, todos aprenderam a lição: Jabutis não sobem em árvores. Se ele está lá, não mexa com ele. Alguém com esse poder o colocou lá.
(Fonte:Laercio Ribeiro's Blog )
Muito bom, gostei
ResponderExcluirmuito bom, gostei!
ResponderExcluirmuito legal o seu blog. sou visitante assíduo.
ResponderExcluirsenti-me honrado com a citação.
a propósito, postei outras fábulas corporativas no meu blog - http://pt-br.wordpress.com/tag/fabulas-corporativas/
talvez se interesse por uma delas (a "Projeto - uma história!", por exemplo).
Tem, na universidade onde trabalho (uece), um sujeito, um professor sem
ResponderExcluirsobrenome, que adora citar esta fabula. Ele sempre a remete quando quer justificar
seus inumeros ilicitos e os de seus comparsas-academicos. Tao cara de páu ele é,
e tao convencido está de que a fabula o justifica, que a cita ate em reunioes de colegiado ou de coordenadores.