Saber ganhar – David Nasser
AGORA, êles sabem que a sua espada não é de pau, meu velho Capitão, e eu volto o pensamento até aquêle quarto da casa paulista, onde as suas mãos trêmulas escreviam a história dêste País, dizendo-me: “Péter plus haut que son cul”.
AGORA, êles sabem que a sua doença democrática só tinha êste remédio, Deputado João Calmon, quando você, na sua admirável teimosia, recusava todo e qualquer acôrdo e desfraldava a bandeira suicida. Se teríamos que morrer vergonhosamente amanhã, que morrêssemos com honra, hoje.
AGORA, êles sabem que as suas palavras não eram simples filigranas verbais, Governador Carlos Lacerda, homem afirmativo, líder másculo, democrata autêntico, brasileiro enlouquecido de amor à sua Pátria - e que se desesperava ao vê-la conduzida ao curral das nações arrebanhadas.
AGORA, êles sabem que a sua intransigência democrática, jovem Adhemar de Barros, môço governador de uma terra indomável, agora êles sabem que a fé o rejuvenesceu, o espírito de luta o retemperou, e você, môço Adhemar, sejam quais forem os erros do passado, a todos redimiu na bravura de sua última jornada.
Mil vêzes você, com todos os pecados, Adhemar, diabo velho! Mil vêzes você que aquêle falso honrado, Jânio Quadros, até agora escondido debaixo da cama, à espera de que a última cidadela se renda, que o último homem se defina.
Ah, tivéssemos nós ensarilhado as armas, tivéssemos nós tido piedade dos canalhas, tivéssemos nós permitido com o nosso silêncio que êles voltassem - e quem se encontraria, agora, no govêrno de São Paulo?
A cachaça cívica, o fauno de Adelaide, o entreguista Jânio Quadros, responsável primeiro pela guinada do Brasil para o Oriente, aliado dos comunistas, traidor de sua Pátria.
E o futuro o julgará pela importância de sua luta na redemocratização de sua Pátria.
AGORA, êles sabem que a sua coragem não se conta pelos fios de cabelo, ó indecifrável Magalhães Pinto, mineiro silencioso, patriota humilde, general sem farda de um dos movimentos mais perfeitos da história revolucionária.
O Brasil nunca se esquecerá que o primeiro grito foi seu, o primeiro gesto de um ballet inesquecível, o primeiro passo da longa marcha democrática.
AGORA êles sabem que os três anos de silêncio do General Mourão não significavam três anos de capitulação, mas três anos de conspiração, três anos de prudência, três anos de silêncio - para o grande despertar da nacionalidade.
Alguns generais que pareciam anestesiados - hoje o sabemos - estavam apenas de vigília. Luiz Guedes, Castello Branco, Costa e Silva, Décio Escobar, Correia de Melo, tantos generais, tantos brigadeiros, tantos almirantes jurados na intransigente defesa da democracia brasileira.
AGORA, êles sabem que aquelas medalhas exibidas pelo General Amaury Kruel não eram de lata nem foram conquistadas noutro campo que não fosse o de honra.
Êles sabem, meu bravo Kruel, que, acima de sua fidelidade a um homem, você colocava a lealdade à sua Pátria ameaçada por um bando de canibais políticos.
SABÍAMOS, todos que estávamos na lista negra dos apátridas - que se êles consumassem os seus planos, seríamos mortos.
Sôbre os democratas brasileiros não pairava a mais leve esperança, se vencidos.
Uma razzia de sangue, vermelha como êles, atravessaria o Brasil de ponta a ponta, liquidando os últimos soldados da democracia, os últimos paisanos da liberdade.
Onde estaria Carlos Lacerda a esta hora? Onde estariam Adhemar, Calmon, Armando Falcão, Castello Branco, Mourão, Gustavo Borges, Anísio Rocha, Alkimin, Magalhães Pinto, Ney Braga, Costa e Silva, Décio Escobar, tantas, tantas vozes e tantas espadas que não se calaram, não se embainharam em todos êsses longos meses da comunização do Brasil?
Se outros fôssem os vencedores, não haveria contemplação.
A VIRTUDE da democracia está em saber ganhar. Em seu nome, em nome da Democracia, não se pode permitir que a injustiça se pratique em nome da Justiça, que sejam anulados, sem processo legal, os mandatos populares, que a Constituição seja rasgada em nome da Constituição.
TODOS sabem o desprêzo vegetariano que voto a certos homens fistulizados que compunham o cerne dêsse Govêrno que caiu.
Mas - advertiu na sua cristalinidade política o próprio Governador da Guanabara - um democrata autêntico não odeia um homem, odeia uma idéia.
Odeia, não a figura ridícula de um Ministro comendo feijoada e bebericando enquanto a lama corria sob os pés de um regime vilipendiado.
Odeia, não os gestos febris de um adolescente político saído de uma taba espiritual para a Casa Civil da Presidência.
Odeia, não aquelas figuras tenebrosas do CGT, aquêles pobres moços ensandecidos da UNE, aquêles sargentos equivocados, mas tudo o que a idéia que êles defendiam, honesta ou estùpidamente, representava.
NÃO é porque eram criminosos, que em criminosos vamos nos transformar.
Não é porque representavam o totalitarismo, a radicalização, o que de mais vergonhoso, mais sórdido, mais brutal e mais brasileiro pudesse existir no Brasil que devemos nós, os democratas, pedir-lhes as armas e as usar com a mesma ausência de liberalidade democrática.
O que nos diferencia dêles é justamente isto. O mesmo que diferencia a carniça que êles são do abutre que não somos.
NÃO significa que os criminosos não devam ser punidos nem os responsáveis irresponsabilizados. Significa que cada um pague pelo que fêz, não pelo que foi.
Ninguém tem culpa de ter sido Ministro de um Govêrno legalmente eleito, constitucionalmente organizado. Ninguém tem culpa de ter sido Ministro de João Goulart, nem mesmo o Senhor Abelardo Jurema.
O QUE me enoja não é ver os ratos fugirem do navio que se afunda, mas aquêles que ontem lhes comiam a comida, ajudar a matá-los.
PARTE o Senhor João Goulart para Pôrto Alegre, para o Uruguai, para a Espanha, sem o meu ódio.
Nunca consegui odiá-lo — e até hoje —- permita-se a um adversário de suas idéias e de seus métodos confessar após o crepúsculo de um deus que tinha os pés de barro — não o consigo odiar.
Vejo-o ainda, no seu pequeno trono do Alvorada, como um pobre homem, incapaz de governar, de distinguir amigos de aproveitadores, inimigos de oponentes.
CAIU porque em seu espírito engarrafado pela mediocridade mais positiva dêste País, nunca deixou de existir o estancieiro que contava os aliados como quem conta o gado no curral.
CAIU porque acreditou que aquêles que lhe faziam planos de continuísmo, acenando com o poder sindical, com o dispositivo militar, acreditavam no que diziam.
E lutariam por tudo aquilo que o Senhor João Goulart acreditava. Mas o Senhor João Goulart não acreditava realmente em nada. A não ser na sua boa estrêla, que era a estrêla vermelha.
RECUSO-ME a pisar sôbre os cadáveres morais dêsses homens sôbre os quais, com o risco da própria vida, dentro das limitações que me eram impostas por uma organização que êles ameaçavam destroçar, tantas vêzes caminhei pela estrada que nos conduzia ao imprevisto de um fim melancólico ou de uma liberdade sonhada.
NÃO será em nome dessa liberdade conquistada que iremos tripudiar sôbre os vencidos.
Aquêles que eram comunistas, continuarão a sê-lo, talvez com menos esperança.
Aquêles que eram os pobres enganados dessa República — talvez abram os olhos, os vencedores não procederem com a mesma fúria, o mesmo despotismo, a mesma insensibilidade daqueles que nem por isto deixaram de ser brasileiros e possivelmente democratas equivocados.
A compreensão e a justiça talvez os ajudem a abrir os olhos.
WILSON FIGUEIREDO conta que, em plena ocupação do velho órgão da Condêssa, um fuzileiro pediu para telefonar para a mulher a quem não via há três dias de longa e sofrida prontidão. Não apenas deixaram o invasor telefonar, mas serviram um cafezinho bem brasileiro. Nesse momento, também, o Brasil estava voltando a ser brasileiro.
POIS é esse cafezinho brasileiro que devemos servir aos que erraram por acreditar demais ou erraram por acreditar de menos.
Respeitemos as suas famílias, as suas idéias falsas, e apuremos apenas os seus possíveis crimes.
A menos que voltem a ser inimigos, a se constituírem em vírus vivos —- os inimigos vencidos deixam de ter nomes.
E a benevolência do governo da contra-revolução e do povo brasileiro, respeitando todos aqueles bandidos, entregadores da pátria, concedendo a anistia a todos, acreditando que estavam curados de sua loucura de acreditar na utopia comunista, que tanto mal e tantos milhões de mortes causou pelo mundo afora, foi a causa da perda dos rumos políticos e da legalidade nos últimos anos: eles voltaram e se apoderaram do Estado, foram novamente implantando suas mesmas idéias perniciosas e já ultrapassadas, passaram novamente a depenar o Estado com seus roubos e falcatruas, voltaram a ser inimigos.
Portanto, hoje eles deixam de ter nomes, são apenas camaradas comunistas que estão novamente espoliando o Brasil e é chegada a hora de se acabar de vez, após mais de 70 anos de ataques, com esse inimigo terrível de nosso País.
Que os homens de bem e democráticos do Brasil se unam novamente, que executem mais uma vez uma contra-revolução, implantando desta vez um sistema político e de governo, tão democrático e legal, tão fiscal e responsável, que seja até avançado para estes tempos, e executando um projeto nacional de educação tão grandioso, que jamais seremos presa fácil desses eternos bandidos da humanidade.
O Globo, 31 de março de 1964.
"Agora se decidirá se nós conseguiremos superar a terrível crise provocada pela inflação, pelos desajustes sociais, pelo descalabro econômico-financeiro, sem perda de nossas instituições livres, ou se, contrário, uma ditadura esquerdista se apossará do País, graças, principalmente, ao enfraquecimento e progressivo desaparecimento das Forças Armadas..."
Jornal do Brasil, 31 de março de 1964.
O Presidente da República sente-se bem na ilegalidade. Está nela e ontem nos disse que vai continuar nela, em atitude de desafio à ordem constitucional, aos regulamentos militares e ao Código Penal Militar.
Êle se considera acima da lei. Mas não está. Quanto mais se afunda na ilegalidade, menos forte fica a sua autoridade. Não há autoridade fora da lei.
E, os apelos feitos ontem à coesão e à unidade dos sargentos e subordinados em favor daquele que, no dizer do próprio, sempre estêve ao lado dos sargentos, demonstra que a autoridade presidencial busca o amparo físico para suprir a carência de amparo legal.
Pois não pode mais ter amparo legal quem no exercício da Presidência da República, violando o Código Penal Militar, comparece a uma reunião de sargentos para pronunciar discurso altamente demagógico e de incitamento à divisão das Forças Armadas. (...)"-
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Jornal do Brasil, 1 de abril de 1964.
Quem chegasse às 8h30m da noite de ontem ao Edifício do Jornal e da Rádio Jornal do Brasil não poderia entrar pois encontraria na porta, metralhadora em punho, um fuzileiro naval. (nota do autor: os fuzileiros navais, sob o comando do Almirante Aragão, apoiavam a revolução comunista do sr João Goulart, como pode ser observado na leitura dos seus comícios, e não a contra-revolução dos governadores e demais militares)
E se olhasse pela parede de vidro dos estúdios da Rádio teria a impressão de assistir a um filme de gangsters: quatro outros fuzileiros, comandados pelo Tenente Arinos, moviam-se como gorilas pelo estúdio, seus movimentos tolhidos pelas metralhadoras que ameaçavam microfones, painéis de instrumentos e os funcionários, estupefatos com aquela irrupção de selvajaria tecnológica em plena Avenida Rio Branco.
Era o Brasil regredindo ao estado de republiqueta latino-americana.
Os fuzileiros navais, ao chegarem, dispararam dois tiros para o ar diante do prédio e entraram de metralhadoras em punho, pistolas na cinta, até o 5o andar.
Tinham ordem de quem? indagamos.
Do Ministro da Marinha, disseram.
Onde está a ordem? Era verbal.
Da Rádio, o Tenente telefonou a um Almirante, sem lhe dizer o nome. O prédio era muito grande, disse. Precisavam reforços. Deixaram dois de guarda na Rádio, outro na porta da rua e foram em busca dos tais reforços, sem dúvida para ocuparem todas as dependências do Jornal do Brasil.
Mas deve estar em desespêro o Govêrno do Sr. João Goulart. Dentro de meia hora, em lugar dos reforços, veio a ordem de retirar. Quem humilha assim os bravos Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil?
Quem os transforma primeiro em gangsters violentos e os faz evacuar em seguida, confusos, um pugilo de homens envergonhados sob o pêso de tanto material bélico?
Quem estimula a indisciplina de marujos e fuzileiros e depois os transforma em bandidos e em seguida em pobres diabos pilhados em flagrante?
A partir de 13 de março o Sr. João Goulart tem injuriado muitos, em muito pouco tempo. Agora, ao que tudo indica, já lhe resta muito pouco tempo para injuriar quem quer que seja."
Ao primeiro minuto de hoje teve início a greve geral em todo o País, por determinação do Comando Geral dos Trabalhadores e em apoio ao Presidente João Goulart, paralisando de imediato os trens da Central do Brasil e da Leopoldina, o Pôrto de Santos e os bondes da Guanabara, com a adesão de universitários.
A decisão da greve foi precipitada pela prisão ontem, no Sindicato dos Estivadores, de vários lideres sindicais pela Polícia Política da Guanabara.
O Partido Comunista Brasileiro responsabilizou ontem os grupos radicais pela precipitação da crise política, tachando de imprudente a tática utilizada por líderes extremados.
Acha o PCB que tal atitude conduzirá à união do centro contra a direita, neutralizando assim a ação dos setores mais moderados da esquerda, e que, no seu entender, levará à deposição do Presidente da República, com lastro na opinião pública."
O Governador Carlos Lacerda, embora tenha dito ao seu Secretariado que não acredita na crise nacional, montou um esquema de segurança para o Palácio Guanabara e para as ruas a êle adjacentes, com a qual pretende resistir contra qualquer intervenção federal no Estado da Guanabara.
Às três horas de hoje o Palácio Guanabara deu nota oficial informando que os fuzileiros para lá se dirigiram e chamava o povo para defender o Governador.
Cêrca de 500 homens da Polícia Militar, sob a ordem direta do Secretário de Segurança, General Salvador Mandim, são empregados na defesa do Palácio do Govêrno. Barricadas foram construídas com sacos de areia e os militares permanecem em regime de prontidão."
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Correio da Manhã, 1 de abril de 1964.
A Nação não mais suporta a permanência do Sr. João Goulart à frente do Govêrno. Chegou ao limite a capacidade de tolerá-lo por mais tempo.
Não resta outra saída ao Sr. João Goulart senão a de entregar o Govêrno ao seu legítimo sucessor. Só há uma coisa a dizer ao Sr. João Goulart: SAIA!
Durante dois anos o Brasil agüentou um Govêrno que paralisou o seu desenvolvimento econômico, primando pela completa omissão, o que determinou a completa desordem e a completa anarquia no campo administrativo e financeiro.
Quando o Sr. João Goulart saiu de seu neutro período de omissão foi para comandar a guerra psicológica e criar o clima de intranqüilidade e insegurança que teve o seu auge na total indisciplina que se verificou nas Forças Armadas.
Isso significou e significa um crime de alta traição contra o regime, contra a República, que êle jurou defender.
O Sr. João Goulart iniciou a sedição no País. Não é possível continuar no poder. Jogou os civis contra os militares e os militares contra os próprios militares. É o maior responsável pela guerra fratricida que se esboça no território nacional.
Por ambição pessoal, pois sabemos que o Sr. João Goulart é incapaz de assimilar qualquer ideologia, êle quer permanecer no Govêrno a qualquer preço.
Todos nós sabemos o que representa de funesto uma ditadura no Brasil, seja ela de direita ou de esquerda, porque o povo, depois de uma larga experiência, reage e reagirá com tôdas as suas fôrças no sentido de preservar a Constituição e as liberdades democráticas.
O Sr. João Goulart não pode permanecer na Presidência da República, não só porque se mostrou incapaz de exercê-la como também porque conspirou contra ela como se verificou pelos seus últimos pronunciamentos e seus últimos atos.
Foi o Sr. João Goulart quem iniciou de caso pensado uma crise política, social e militar, depois de ter provocado a crise financeira com a inflação desordenada e o aumento do custo de vida em proporções gigantescas.
Qualquer ditadura, no Brasil, representa o esmagamento de tôdas as liberdades como aconteceu no passado e como tem acontecido em todos os Países que tiveram a desgraça de vê-la vitoriosa.
O Brasil não é mais uma nação de escravos. Contra a desordem, contra a masorca, contra a perspectica de ditadura, criada pelo próprio Govêrno atual, opomos a bandeira da legalidade.
Queremos que o Sr. João Goulart devolva ao Congresso, devolva ao povo o mandato que êle não soube honrar.
Nós do Correio da Manhã defendemos intransigentemente em agôsto e setembro de 1961 a posse do Sr. João Goulart, a fim de manter a legalidade constitucional. Hoje, como ontem, queremos preservar a Constituição. O Sr. João Goulart deve entregar o Govêrno ao seu sucessor, porque não pode mais governar o País.
A Nação, a democracia e a liberdade estão em perigo. O povo saberá defendê-las. Nós continuaremos a defendê-las."
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Diário de Notícias, 1 de abril de 1964.
"À partir da tarde de ontem, principalmente depois que desceram os tanques da Vila Militar, dez dos quais foram colocados em frente ao Ministério da Guerra, onde também se encontram numerosos carros blindados e de combate, a crise político-militar pareceu assumir aspectos realmente perigosos, com a cidade sob o domínio de grande tensão e povo como que à espera de uma revolução a qualquer momento.
Á margem dos preparativos da população como que para prevenir-se, sacando nos bancos e adquirindo mantimentos, ocorreram diversos incidentes entre populares e policiais, e dos quais o de maior gravidade se verificou na Federação dos Estivadores, na rua Santa Luzia.
Á esta altura, em consequência da paralisação dos trens da Central e da Leopoldina, respectivamente, às 17h30m e às 19h30m, a cidade parecia em colapso no setor de transportes, com grandes filas se formando ao longo dos pontos de ônibus e lotações para a Zona Norte e cidades fluminenses.
As sédes das ferrovias e os demais próprios federais passaram, então, a ser guarnecidos por tropas do Exército.
A tensão crescia à medida que circulavam as notícias sôbre a situação em Minas, onde já se teria iniciado a revolução. Tôda Minas, principalmente a capital e cidades como Governador Valadares e Juiz de Fora, já anteriormente agitadas, estavam, segundo os comentários, "pegando fogo". As rodas de populares discutindo política se formavam e não eram poucos os incidentes registrados entre os mais exaltados."
"A perspectiva mais alarmante da situação brasileira funda-se num dado concreto que não é possível obscurecer. É o fato de que jamais em nossa História, e até o presente, as esquerdas radicais - nomeadamente o comunismo e suas clássicas correntes auxiliares - estiveram tão à vontade, desfrutaram tanto prestígio e aproximaram-se tanto do êxito quanto no momento atual.
Por mais que negaceie, tergiverse e dissimule, o Sr. João Goulart, ninguém poderá negar - porque está à vista de todos, porque é público e ostensivo - que os elementos chamados de "formação marxista" não somente conseguiram infiltrar-se fàcilmente em todos os postos, como também são os preferidos pelo govêrno para êsses postos, sobretudo os de comando e de direção.
Atualmente, no presente govêrno, que ainda se diz democrata, a ideologia marxista e mesmo a militância comunista indisfarçada constituem recomendação especial aos olhos do govêrno. Como se já estivéssemos em pleno regime "marxista-leninista", com que sonham os que desejam incluir sua pátria no grande império soviético, às ordens do Kremlin. (...)"
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O Globo, 2 de abril de 1964
"Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. Devemos felicitar-nos porque as Forças Armadas, fiéis ao dispositivo constitucional que as obriga a defender a Pátria e a garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, não confundiram a sua relevante missão com a servil obediência ao Chefe de apenas um daqueles poderes, o Executivo.(...)"
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Diário de Notícias, 2 de abril de 1964.
"Enquanto o Congresso Nacional iniciava, em plena madrugada, em Brasília, a votação do "impeachment" do Sr. João Goulart, homiziado no sul, numa sessão tumultuada pela oposição do PTB, que ameaçava ir até o esfôrço físico para impedir o debate da matéria, o general Amauri Kruel chegava a São Paulo para conferenciar com o governador Ademar de Barros e ultimar os preparativos para os deslocamentos das tropas que deverão seguir para o Rio Grande do Sul a fim de esmagar o último foco de rebelião concentrado em Pôrto Alegre, sob o comando do Sr. João Goulart e Leonel Brizola.
Ao mesmo tempo, deverão ser abastecidos, hoje, em Santos, os três navios da esquadra, Tamandaré, Pará e Amazonas, que segundo se anuncia, sob o comando geral do almirante Sílvio Heck, rumam para o sul a fim de cooperar no completo esmagamento dos insurretos.
Ao mesmo tempo, por ordem do Sr. Ademar de Barros, começa hoje em São Paulo, o racionamento de gasolina fixado em 70% para as indústrias e transportes coletivos e, em 30% para os carros particulares. A medida vai afetar profundamente o abastecimento de Brasília uma vez que o govêrno do Estado requisitou todos os estoques que transitam em direção à capital federal."
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Tribuna da Imprensa, 2 de abril de 1964.
"Escorraçado, amordaçado e acovardado deixou o poder como imperativo da legítima vontade popular o sr. João Belchior Marques Goulart, infame líder dos comuno-carreiristas-
Um dos maiores gatunos que a história brasileira já registrou, o Sr. João Goulart passa outra vez à história, agora também como um dos grandes covardes que ela já conheceu.
Temos o direito de dizer tudo isso do Sr. João Goulart porque não lhe racionamos os adjetivos certos, por mais contundentes que fossem, na hora em que êle dominava o poder, e posava de líder todo-poderoso da Nação.
Como não nos intimidamos na hora em que Jango e os comunistas estavam por cima e amargamos até cadeia, não precisamos nem fazer a demagogia da generosidade.
Mesmo porque não pode haver generosidade nem contemplação com canalhas. E Jango, Jurema, Assis Brasil, Arraes, Dagoberto, Darcy Ribeiro, Waldir Pires e toda a quadrilha que assaltou o poder não passam de canalhas.
E além de canalhas, covardes. E além de covardes, cínicos. E além de cínicos, pusilâmines. E além de pusilâmines, desonestos. Bravatearam, fingiram-se machões, disseram que fariam isto e aquilo, mas aos primeiros tiros sairam correndo espavoridos e ainda estão correndo até agora.
Alguns, como Aragão, como Assis Brasil, como Crisanto de Figueiredo, como Arraes, como Cunha Melo, como todo o rebotalho comunista, não serão encontrados tão cedo. (...)
Nunca se viu homens tão incapazes, tão desonestos e tão covardes.
Agora que o País se livrou do fantasma da comunização podemos repetir o que vínhamos dizendo exaustivamente: todo comunista é covarde e mau caráter. Os episódios de agora vieram provar que estávamos cobertos de razão. (...)
O Povo brasileiro lavou a alma. O Carnaval que se comemorou ontem em plena chuva só poderia mesmo ter sido feito por um povo que estava precisando dessa desforra que lhe era devida precisamente há 30 meses.
O povo que comemorou ontem a queda de jango foi o mesmo que votou contra êle em 1960 e foi traído pela renúncia de Jânio. A comemoração de hoje é pois uma revanche e uma recuperação.
Precisamos agora de organizar o mais ràpidamente possível o nôvo govêrno, pois os aproveitadores de sempre já cerram fileiras em tôrno dos cargos, já se apresentam como os heróis de uma batalha que não travaram.
Junto com a organização do nôvo govêrno temos que providenciar, também urgentemente, para que os direitos políticos dos que foram ontem legitimamente banidos pelo povo, sejam cassados para sempre.
(nota do autor: aqui reside um dos maiores erros de toda a história deste País, e pela situação que estamos vivendo hoje, ainda pagaremos muito caro por ele).
Não se trata de vingança, nem estamos aqui defendendo o esquartejamento dos derrotados. Mas quando o destino do País está em jôgo, quando se trata de decidir da sorte dos que queriam comunizar o País, não podemos ser generosos ou sentimentais.
Para os civis, cassação dos direitos políticos. Para os militares como Assis Brasil, Crisanto, Cunha Melo, Napoleão Nobre, Castor da Nóbrega e para todos os comuno-carreiristas das Fôrças Armadas, o caminho é um só e inevitável: a reforma pura e simples. Não falavam tanto em reforma? Pois apliquemos a fórmula a êles.
Enfim, começa hoje uma nova era para o Brasil.
Confiemos no espírito público dos homens que salvaram a democracia brasileira, e no discernimento e superioridade com que o marechal Dutra se conduzirá nos próximos 22 meses."
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O Dia, 2 de abril de 1964.
"O Sr. Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados, poderá assumir ainda hoje a Presidência da República, em virtude do que dispõe o artigo 79 parágrafo 2o da Constituição, que declara: Vagando os cargos de Presidente e Vice Presidente da República, far-se á eleição 60 dias depois de abertas a última vaga.
Se as vagas ocorrerem na segunda metade do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita 30 dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma estabelecida em lei.
Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período dos seus antecessores.
Em consequência, o Sr. Ranieri Mazzilli deverá exercer a Presidência até a posse do novo presidênte, a ser eleito no dia 1o de maio próximo, pelo Congresso Nacional.
Em face da absoluta normalidade reinante na cidade com a cessação dos motivos que a determinaram, terminou à zero hora de hoje a greve geral decretada terça-feira.
Todos deverão retornar tranqüilamente ao trabalho, evitando, contudo, aglomerações públicas nas ruas.
Sòmente os bancos ainda permanecerão fechados, hoje e amanhã, em virtude de decreto."
"Brasília, 1o - Até às 22 horas de hoje o Sr. João Goulart ainda se encontrava na Granja do Torto, nesta capital, em companhia de sua espôsa e filhos”.
No aeroporto militar, achava-se, pronto para decolar a qualquer instante um "Coronado", moderno jato da Varig, que tanto poderia se dirigir para Buenos Aires como para a Espanha, segundo afirmam fontes ligadas à família presidencial.
"Pôrto Alegre, 1o - O Sr. João Goulart, cêrca das 23 horas, chegou a esta capital em companhia de sua família e do Sr. Darci Ribeiro."
Todos os comandos militares haviam aderido ás tropas do general Castelo Branco.
Em Recife, soldados do IV Exército cercaram o Palácio do Governador e prenderam o Sr. Miguel Arrais, por ordem do general Justino Alves.
O Ministro Lafaiete de Andrade enviou emissário a Minas para decretar solidariedade do Supremo Tribunal Federal à revolução.
Às 16 horas, foi lida esta ordem, firmada pelo general Castelo Branco:
"Que as tropas do I Exército cessem todas as operações e voltem aos quartéis".
Era o fim da resistência e a vitória da Contra-Revolução.
As autoridades civis e militares estão lembrando a tôda a população que estão em vigor as leis e os códigos. Os culpados por atos condenáveis serão punidos. Aconselham que a população se abstenha de participar de aglomerações e movimentos coletivos. Avisam ainda que a normalidade voltou ao País e cessaram, imediatamente, todos os movimentos grevistas.
Dezenas de automóveis trafegaram pelo centro da cidade, tocando suas businas, em sinal de alegria pela vitória da democracia em todo o País.
As estações de rádio e televisão, que estavam sob censura, iniciaram suas transmissões normais, pouco depois das 17 horas.
Os contingentes de fuzileiros navais que ocupavam as redações de alguns jornais, foram recolhidos aos quartéis.
Por volta das 17,15, o Forte de Copacabana anunciava, com uma salva de canhão, a aproximação das tropas do general Amauri Kruel, que atingiria o Estado da Guanabara às últimas horas da noite de ontem.
A população de Copacabana saiu ás ruas, em verdadeiro Carnaval, saudando as tropas do Exército.
Chuvas de papéis picados caíam das janelas dos edifícios enquanto o povo dava vazão, nas ruas, ao seu contentamento. (...)"
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