terça-feira, 30 de dezembro de 2008

FEBEAPA - Stanislaw Ponte Preta

.
FEBEAPA: O Festival de Besteira Que Assola o País

Stanislaw Ponte Preta
(Sérgio Porto)


Disse Stanislaw no FEBEAPA:

"É difícil ao historiador precisar o dia em que o Festival de Besteira começou a assolar o País. Pouco depois da "redentora", cocorocas de diversas classes sociais e algumas autoridades que geralmente se dizem "otoridades", sentindo a oportunidade de aparecer, já que a "redentora", entre outras coisas, incentivou a política do dedurismo (corruptela de dedo-durismo, isto é, a arte de apontar com o dedo um colega, um vizinho, o próximo enfim, como corrupto ou subversivo — alguns apontavam dois dedos duros, para ambas as coisas), iniciaram essa feia prática, advindo daí cada besteira que eu vou te contar".

Vamos a algumas amostras:

"O mal do Brasil é ter sido descoberto por estrangeiros" (Deputado Índio do Brasil, Assembléia do Rio).


O cidadão Aírton Gomes de Araújo, natural de Brejo Santo, no Ceará, era preso pelo 23.º Batalhão de Caçadores, acusado de ter ofendido "um símbolo nacional", só porque disse que o pescoço do Marechal Castelo Branco parecia pescoço de tartaruga e logo depois desagravava o dito símbolo, quando declarava que não era o pescoço de S. Exa. que parecia com o da tartaruga: o da tartaruga é que parecia com o de S. Exa.


Cerca de 51 bandeiras dos países que mantêm relação com o Brasil foram colocadas no Aeroporto de Congonhas. O Secretário de Turismo de São Paulo — Deputado Orlando Zancaner — quando inaugurou a ala das bandeiras, disse que "era para incrementar o turismo externo".


Quando a Censura Federal proibiu em Brasília a encenação da peça Um Bonde Chamado Desejo, a atriz Maria Fernanda foi procurar o Deputado Ernani Sátiro para que o mesmo agisse em defesa da classe teatral. Lá pelas tantas, a atriz deu um grito de "viva a Democracia". O senhor Ernani Sátiro na mesma hora retrucou: "Insulto eu não tolero".


O Diário Oficial publica "Disposições de Seguros Privados" e mete lá: "O Superintendente de Seguros Privados, no uso de suas atribuições, resolve (...), "Cláusula 2 — Outros riscos cobertos — O suicídio e tentativa de suicídio — voluntário ou involuntário".


Em Niterói o professor Carlos Roberto Borba iniciou ação de desquite contra a professora Eneida Borba, alegando que sua esposa não lhe dá a menor atenção e recebe mal seus carinhos quando é hora de programas de Roberto Carlos na televisão. A professora vai aprender que mais vale um Carlos Roberto ao vivo que um Roberto Carlos no vídeo.


Colhemos num coleguinha do Jornal do Brasil:
"O General José Horácio da Cunha Garcia fez uma firme apologia da Revolução e manifestou-se contrariamente às teses de pacificação, bem como condenou o abrandamento da ação revolucionária. O conferencista foi aplaudido de pé". O distraído Rosamundo leu e, na sua proverbial vaguidão, comentou: "Não seria mais distinto se aplaudissem com as mãos?".


Enquanto o Marechal Presidente declarava que em hipótese alguma permitiria fosse alterada a ordem democrática por estudantes totalitários, insuflados por comunistas notórios, quem passasse pela Cinelândia no dia 1.º de abril depararia com o prédio da assembléia Legislativa totalmente cercado por tropas da Polícia Militar. Na certa, a separação de poderes, prevista na Constituição, passará a ser feita com cordão de isolamento e muita cacetada.


Notícia publicada pelo jornal O Povo, de Fortaleza (CE): "O Dr. Josias Correia Barbosa, advogado e professor, esteve à beira de um IPM (Inquérito Policial Militar) por haver passado um telegrama para sua sobrinha Loberi, em Salvador, comunicando-lhe que a bicicleta e as pitombas tinham seguido. Houve diligencias pelas vizinhanças, parentes foram procurados e outras providências tomadas. Passados dois dias, soube o Dr. Josias que o despacho telegráfico não fora transmitido porque um James Bond do DCT (Departamento de Correios e Telégrafos) estranhara os termos "bicicleta", "pitombas" e "Loberi", que "deviam ser de um código secreto".


"Os jornalistas deveriam apanhar da polícia não só durante a passeata, mas antes também. Eles são incapazes de reconhecer o valor da polícia. Os fotógrafos, por exemplo, nunca fotografam os estudantes batendo no policial". Essa declaração foi feita pelo Secretário de Segurança de Minas Gerais, coronel Joaquim Gonçalves.


A peça "Liberdade, Liberdade" estreou em Belo Horizonte e a Censura cortou apenas a palavra prostituta, substituindo-a pela expressão: "Mulher de vida fácil", o que, na atual conjuntura, nos parece um tanto difícil. Ninguém mais tá levando vida fácil.


Segundo Tia Zulmira "o policial é sempre suspeito" e — por isso mesmo — a Polícia de Mato Grosso não é nem mais nem menos brilhante do que as outras polícias. Tanto assim que um delegado de lá, terminou seu relatório sobre um crime político, com estas palavras: "A vítima foi encontrada às margens do riu sucuriu, retalhada em 4 pedaços, com os membros separados do tronco, dentro de um saco de aniagem, amarrado e atado a uma pesada pedra. Ao que tudo indica, parece afastada a hipótese de suicídio".


Em Campos (RJ) ocorria um fato espantoso: a Associação Comercial da cidade organizou um júri simbólico de Adolph Hitler, sob o patrocínio do Diretório Acadêmico da Faculdade de Direito. Ao final do julgamento Hitler foi absolvido.


A mini-saia era lançada no Rio e execrada em Belo Horizonte, onde o Delegado de Costumes (inclusive costumes femininos), declarava aos jornais que prenderia o costureiro francês Pierre Cardin (bicharoca parisiense responsável pelo referido lançamento), caso aparecesse na capital mineira "para dar espetáculos obscenos, com seus vestidos decotados e saias curtas". E acrescentava furioso: "A tradição de moral e pudor dos mineiros será preservada sempre". Toda essa cocorocada iria influenciar um deputado estadual de lá — Lourival Pereira da Silva — que fez um discurso na Câmara sobre o tema "Ninguém levantará a saia da Mulher Mineira".


Em Brasília, depois de um dos maiores movimentos do Festival de Besteira, que bagunçou a Universidade local, o Reitor Laerte Ramos — figurinha que ama tanto uma marafa que cachaça no Distrito Federal passou a se chamar "Reitor" — nomeava um professor para a cadeira de Direito Penal. O ilustre lente nomeado começou com estas palavras a sua primeira aula: "A ciência do Direito é aquela que estuda o Direito".


A Igreja se pronunciou, através da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, sobre recentes publicações pretensamente científicas, "que abordam problemas relacionados ao sexo com evidente abuso". O documento não explicou se o abuso era do problema ou se o abuso era do sexo. Em compensação, nessa mesma conferência, Dom José Delgado, Arcebispo de Fortaleza, dava entrevista à Agência Meridional sobre pílulas anticoncepcionais, uma pílula formidável para fazer efeito no Festival de Besteira. Como se disse bobagem sobre o uso ou não da pílula, meus Deus!!! Dom Delgado, por exemplo, dizia: "A protelação do casamento é a única conclusão a que chego, atualmente, para a planificação da família e o controle da natalidade. E, depois disso, só existe um caminho seguro: o da continência na vida conjugal". Como vêem, o piedoso sacerdote era um bocado radical e queria acabar com a alegria do pobre. Ainda mais, falando em sexo e em continência na vida conjugal, deixou muito cocoroca achando que, dali por diante, era preciso bater continência para o sexo também.


(Textos extraídos dos livros "O Festival de Besteira que Assola o País")



Nascido no Rio de Janeiro em 1923, o humorista e cronista Sérgio Porto, que também trabalhou em rádio e para o cinema, realizou na imprensa carioca uma obra crítica de espírito eminentemente popular. O codinome Stanislaw Ponte Preta, criado em 1951, foi inspirado por Serafim Ponte Grande, personagem de Oswald de Andrade. O humor de Stanislaw ficou celebrizado nos tipos que criou (Tia Zulmira, Primo Altamirando, Bonifácio Patriota, Dr. Data Vênia e outros) e nas criações vocabulares ou de lugares-comuns que lançou e se incorporaram ao patrimônio coloquial brasileiro.

É autor de uma obra carioquíssima, até hoje insuperável, transpondo para jornais, livros e revistas o saboroso coloquial da cidade. Segundo o escritor Mário da Silva Brito, Stanislaw, mais “heterônimo” do que pseudônimo de Sérgio Porto, “era a encarnação do riso popular e da crítica alegre e festiva, maliciosa e amena, mas nem por isso menos contundente, de nossas posturas individuais e coletivas”.

Foi com Febeapá — Festival de Besteiras que Assola o País (1966), volume dedicado aos abusos cometidos no país sob inspiração da ideologia da Redentora, apelido do golpe militar de 1964, que ele alcançou seu grande sucesso. O autor afirmava ser difícil precisar o dia em que as besteiras começaram a assolar o Brasil, mas disse ter notado um alastramento desse fenômeno depois que uma inspetora de ensino do interior de São Paulo, ao saber que o filho tirara zero numa prova de matemática (embora sabendo que o menino tratava-se de um debilóide), não vacilara em apontar o professor às autoridades como perigoso agente comunista. Outro exemplo, pela pena do autor: “Quando se desenhou a perspectiva de uma seca no interior cearense, as autoridades dirigiram uma circular aos prefeitos, solicitando informações sobre a situação local depois da passagem do equinócio. Um prefeito enviou a seguinte resposta à circular: 'Doutor Equinócio ainda não passou por aqui. Se chegar será recebido como amigo, com foguetes, passeata e festas’”. Era mestre das comparações enfáticas, como “mais inchada do que cabeça de botafoguense”, “mais feia do que mudança de pobre”.

Devido ao enorme sucesso alcançado pelo livro, Stanislaw lançou em 1967 um segundo volume, o que, de acordo com a professora Maria Célia Rua de Almeida Paulillo, “atesta a perseverança de tão nefasto festival em nosso país”.

Ainda conforme Maria Célia, Stanislaw parece escrever seus textos não para o leitor interessado em literatura, mas para aquele que compra o jornal para acompanhar o noticiário ou consultar as ofertas de emprego e que, casualmente, topa com a crônica, que lê de modo rápido e desatento. Por isso, ao analisarmos os escritos do autor, percebemos que “seus procedimentos são verdadeiros 'ganchos' capazes de sensibilizar o mais distraído ou desinteressado leitor de crônicas”.

Em 1968, lançou seu último livro, Na Terra do Crioulo Doido — A Máquina de Fazer Doido (Febeapá nº 3). A série Febeapá se transforma em “trilogia”. No mesmo ano, morreu no Rio de Janeiro.

(Fontes: www.releituras.com, educarparacrescer.abril.com.br)

4 comentários:

  1. Boa tarde querida amiga Berenice!

    Feliz 2009! Desejo que as experiências próximas de um Ano Novo lhes sejam Construtivas, Saudáveis e Harmoniosas. Muita Paz, Saúde e Amor em seu contínuo despertar! Felicidades, Realizações e Muitas Alegrias! Luz!

    Aproveito para deixar um convite...
    Gostaria de te convidar para um “Momento de Paz”, uma Blogagem Coletiva pela Paz Mundial, que acontecerá durante todo o mês de janeiro (01/01 a 31/01/09). O objetivo maior é comemorar o Dia Mundial da Paz e da Fraternidade Universal, com uma mobilização em forma de campanha para um Mundo Melhor. Faça parte deste grupo que acredita que é possível que a humanidade encontre o caminho da Paz, através do abandono das armas. Reconheça este estado de calma e tranqüilidade com ausência de perturbações ou agitação. Todos nós somos e devemos viver como irmãos e a Paz, representada pelo pombo e pela bandeira branca, é um objetivo de Vida!

    Geralmente uma Blogagem Coletiva é um convite direcionado somente para quem tem um blog ou um site em qualquer plataforma da internet. O Quiosque Azul, o meu blog, convida também a todos que não possuem qualquer portal e queiram participar divulgando e colaborando para a Paz Mundial através do formulário de comentário ou e-mail que relaciono ao final desta mensagem. Por favor, participe, divulgue e colabore! Comunique e convite os seus amigos e/ou leitores. Toda e qualquer colaboração será bem vinda! Veja todas as instruções de como participar no link abaixo:

    http://quiosqueazul.blogspot.com/2008/12/momento-de-paz.html

    Desde já agradeço e desejo que esta mobilização alcance o seu maior objetivo e seja uma grande soma para União de todas as Nações.
    e-mail para blogagem Quiosque Azul:
    happyblue.blogagemcoletiva@gmail.com

    Blog Quiosque Azul – Um Lugar em Minha Vida!
    http://quiosqueazul.blogspot.com/

    Link direto para esta blogagem na Comunidade do diHITT
    http://dihitt.com.br/quiosqueazul/noticia/blogagem-coletiva-momento-de-paz-/

    Agradeço também se puder colocar a imagem do selo oficial (pequeno), aqui em sua side-bar (barra lateral), em forma colaborativa de divulgação desta Campanha pela Paz Mundial: “Momento de Paz”. Obrigado! Luz! Renato (HappyBlue)

    ResponderExcluir
  2. Berenice,
    Tem um presente de fim de ano para você lá no blog, espero que goste!!

    www.jjcabeleireiros.com.br/blog.html

    ResponderExcluir
  3. Parabéns pelo artigo relembrando esse gênio que foi Sérgio Porto (ou Stanislaw Ponte Preta). Suas obras eram boa literatura feita por um homem de raro talento e muita coragem para se opor, com bom humor, àquele regime numa época em que todos se calavam por medo. Stanislaw Ponte Preta é O cara!
    Abraços
    Marcelo - São Paulo (SP)

    ResponderExcluir
  4. Prezada Senhora,

    Na quailidade de advogada do Sr. Sérgio Antônio Monteiro Porto, venho informa-lá de que a foto que ilustra este Post não é do escritor Stanislaw Ponte Preta, mas do Sr. Sérgio Porto que tomou conhecimento, nesta data, da utilização indevida e não autorizada de sua imagem e, por isso, solicita sua IMEDIATA retirada.

    No aguardo das devidas providências, subscrevo-me.

    MÔNICA MONTEIRO PORTO
    OAB/SP 178.810
    advogados@monteiroporto.com.br

    ResponderExcluir

Seu comentário é muito bem vindo.