Palavras são cruciais nas relações amorosas, assim como em tudo na vida. O que seria dos homens inteligentes se bastasse erguer as sobrancelhas e retesar os músculos do peito para seduzir as mulheres? Ainda bem que não funciona assim. Para atrair parceiras os homens ainda são obrigados a falar, escrever e mandar mensagens, até mesmo dançar - uma forma poderosa e afrodisíaca de linguagem corporal, me dizem. Como se empenham de todo coração, esperam alguma forma de recompensa, mas ela nem sempre vem.
Dias atrás, um amigo mandou um torpedo cheio de suingue para uma moça que conhecera numa festa. Em pouco mais de 120 toques ele conseguiu transmitir humor, elogios e interesse carnal pela moça. A resposta, porém, foi devastadora. “Você é um fofo...”, ela escreveu. Poderia ter dito “engraçado”, poderia ter dito “cara de pau”, poderia ter dito “safado”, mas escolheu dizer “fofo”. Perceberam o tamanho do desastre? Foi o mesmo que chamá-lo de “bonitinho”, ou, ainda pior, “um querido”. Meu amigo percebeu que não vai sair com a moça.
Fofo é o adjetivo que as garotas usam para o sobrinho delas de dois anos. Fofo elas dizem do gatinho da vizinha que mia para elas no corredor do prédio. Fofo é o amigo gay, aquele que liga à meia-noite e um minuto no dia do aniversário delas. Fofo é o cara gentil que a levou para jantar na semana em que ela havia brigado com o namorado. Ela nem lembra direito o nome daquele superfofo. Era Pablo, Diego ou Ramiro? Um nome espanhol, com certeza.
Para resumir, fofo é uma palavra que parece não ter relação no cérebro feminino com sexo e paixão, e nenhuma proximidade com aventura. É um termo assexuado. Se ela acha você fofo, é certo que vai aceitá-lo como amigo no Facebook, mas tirar por cima aquele vestidinho de verão, desmanchando os cabelos dela no processo, isso você não vai conseguir. Muito menos um romance trepidante.
Estou exagerando? Claro, mas apenas me esforço para deixar claro o meu ponto: fofo não é uma palavra que as mulheres usam para os homens que elas desejam.
Ao chamar o sujeito de fofo, você não está apenas sugerindo que ele não faz amolecer os seus joelhos e nem acelera os seus batimentos cardíacos. Você está informando que o vê no diminutivo, café com leite, mirim. Para você ele é um gatinho, não um tigre. Do ponto de vista masculino é uma informação das mais broxantes. Como as relações humanas não são uma ciência exata, há notáveis exceções a essa regra. Uma moça que eu conheço vive reclamando que o namorado dela demorou a se aproximar, embora ela tivesse emitido vários sinais de interesse. A explicação dele é muito simples. “Ela me chamava de fofo e de querido. Entendi que não queria nada comigo”, diz ele. Mulher que tenha urgência em levar um sujeito para o quarto talvez devesse usar com ele outro tipo de linguagem. Deixe fofo para o irmão adolescente da sua amiga, aquele que cora quando fala com você.
Não se trata, entendam bem, de um mero problema de comunicação, aquele clássico em que a mulher diz uma coisa e o homem entende outra. Fofo é fofo para todo mundo: meigo, atencioso, delicado, um amor. A questão essencial é o efeito da palavra na autoestima masculina. Fofo tem uma conotação doce demais, inofensiva. Os homens não gostam de ser vistos assim. Mesmo os mais dóceis gostam de pensar em si mesmos como predadores perigosos e pegadores implacáveis, capazes de aturdir e dominar as mulheres - ainda que frequentemente aconteça o contrário.
Quem quiser ter uma ideia cinematográfica do que eu estou dizendo, veja - ou reveja - aquele trecho do filme Quase famosos em que a linda Penny Lane diz ao apaixonado William que ele é “doce demais” para o mundo dela. A resposta dele vale um curso intensivo sobre orgulho ferido masculino. “Doce, de onde você tirou isso?”, ele pergunta, aos gritos. “Eu sou sombrio e misterioso. Eu posso ser muito perigoso. Você deveria ter percebido isso a meu respeito: eu sou o inimigo!” É claro que o William do filme tem apenas 15 anos, mas emocionalmente representa os homens de todas as idades. Nenhum deles gosta de ser o bonzinho que não come ninguém.
Isso não quer dizer, evidentemente, que não haja espaço para a doçura masculina nas relações entre homens e mulheres. Ela é absolutamente essencial, na verdade. As mulheres precisam recebê-la e os homens necessitam expressá-la, e vice-versa. Carinho físico e verbal são ingredientes essenciais do nosso metabolismo afetivo. Sem eles definharíamos emocionalmente, como macaquinhos tristes.
A parte difícil está em fazer com que essa óbvia necessidade de afeto conviva com as nossas fantasias sexuais, nas quais o carinho parece não deter a primazia.
Os homens têm prazer em sentirem-se másculos e dominantes na hora da sedução. E boa parte das mulheres parece encontrar satisfação em ser conduzida por um parceiro seguro. Esse teatro, por velho que seja, ainda é muito apreciado. O homem mais suave do mundo vestirá uma alma de Lobo para devorar a mulher que deseja. Ela, por mais altiva que seja, envergará o manto vermelho de Chapeuzinho para deixar-se levar, ansiosa e trêmula, para o abatedouro. Isso faz parte de um roteiro tão velho quanto os contos de fada, e funciona.
Fazer diferente exige personalidade.
A moça teria que abrir mão das fantasias de princesa e anunciar, com toda clareza, que o sujeito é um fofo, e POR ISSO, ela é louca por ele. Sexualmente louca por ele, capiche? O rapaz agraciado com essa deferência poderia abrir mão das veleidades de príncipe e aceitar, sem complexos, o papel de macho doce que lhe cabe nesse arranjo. Ser chamado de fofo não é o sonho erótico dos homens, mas talvez a palavra possa ser subvertida. Quem diz que não pode haver fofo cafajeste, fofo descarado, fofo safado e feliz? Aliás, parece uma ideia fofa...
(Ivan Martins - Fonte: http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/ivan-martins/noticia/2013/01/fofo-querido-um-amor.html)
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