Rafael Spuldar
Da BBC Brasil em São Paulo
Adversário de Lula em 2002, Serra agora é visto com ressalvas
Os mercados, que se agitaram em 2002 com a possível eleição de Luiz Inácio Lula da Silva para a sucessão de Fernando Henrique Cardoso, agora veem com cautela o segundo turno da disputa presidencial entre José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT), segundo analistas entrevistados pela BBC Brasil.
Oito anos atrás, diante da provável vitória de Lula, o dólar subia, as avaliações das agências de risco pioravam e até o megainvestidor George Soros dizia que o Brasil daria um calote na dívida.
O então candidato do PT teve que vir a público para garantir a manutenção dos compromissos com credores, restaurar a tranquilidade no sistema financeiro e abrir caminho para a oposição da época chegar ao Planalto.
Agora, com a retomada do crescimento e o clima de otimismo na economia brasileira, Lula é governo, faz campanha por Dilma e é o tucano Serra – justamente o candidato derrotado em 2002 - quem tem de convencer o eleitor a apostar em uma mudança no Planalto.
Para o diretor da consultoria Prospectiva, Ricardo Sennes, "temor" é uma palavra muito forte para avaliar a reação do mercado a uma possível vitória de Serra. Ele diz, no entanto, que diversos setores consideram o tucano um interlocutor mais difícil de negociar do que Dilma.
"Serra tem convicções fortes em alguns temas, o que não o torna muito palatável para ouvir certas sugestões", afirmou Sennes à BBC Brasil.
Já o professor de Ambiente Econômico Global do Insper, Otto Nogami, vê no mercado uma "certa desconfiança" quanto a Serra, mas acrescenta que um governo do PSDB seria mais favorável ao setor privado por, supostamente, favorecer um crescimento mais "estruturado", a partir de uma política fiscal mais conservadora.
"Muita gente diz que a continuidade do governo (do PT) seria melhor para ganhar dinheiro, mas não necessariamente para criar uma situação sólida para a economia", avalia Nogami.
Política monetária
Os dois especialistas concordam ao afirmar que sinais dados por Serra de possíveis mudanças na política monetária e cambial, incluindo ajustes na governança do Banco Central e na cotação do real, por exemplo, podem gerar incerteza e estimular cautela no mercado, mas sem consequências mais graves.
Política monetária
Os dois especialistas concordam ao afirmar que sinais dados por Serra de possíveis mudanças na política monetária e cambial, incluindo ajustes na governança do Banco Central e na cotação do real, por exemplo, podem gerar incerteza e estimular cautela no mercado, mas sem consequências mais graves.
"Interferências nas leis de mercado, seja de câmbio ou juros, não são muito bem vistas, surge certa preocupação", diz Nogami. Ele acrescenta, entretanto, que qualquer instabilidade que possa ocorrer na bolsa de valores será pontual.
Sennes também admite que "a forma e o conteúdo" das possíveis intervenções de Serra podem gerar expectativa, mas lembra que o tucano tem uma relação muito boa com o setor financeiro desde a criação, em 1995, do Proer - programa que possibilitou a reestruturação dos bancos brasileiros durante a sua gestão como ministro do Planejamento (1995-1996).
O sócio-diretor da LCA Consultoria, Fernando Sampaio, vê no Congresso um maior potencial gerador de incerteza quanto a um governo de Serra. Para ele, dificuldades na montagem de uma base parlamentar preocupariam mais o mercado de ações do que a incerteza nas diretrizes econômicas.
Tanto Sampaio como Sennes veem o setor empresarial dividido quanto a apoiar um ou outro candidato no segundo turno. Segundo o diretor da LCA, os interesses específicos setoriais causam uma "dispersão de posicionamentos".
Já o diretor da Prospectiva diz ser "curioso" que o setor privado se divida entre Dilma e Serra. "Em geral, supõe-se que um candidato de centro teria mais apoio do empresariado, mas o governo Lula e a Dilma conseguem ter um relacionamento positivo com vários setores", afirma.
Reação em Wall Street
Atento ao resultado da eleição no Brasil, o mercado americano parecia já contar com uma vitória de Dilma no primeiro turno. O diretor do Eurasia Group, Christopher Garman, diz que seus clientes em Wall Street "não queriam mais nem updates (novidades)" sobre as eleições.
Segundo Garman, a única dúvida era sobre quem seriam os ministros no governo de Dilma. "Agora, acho que os investidores vão começar a olhar a eleição com um pouco mais de atenção", afirma.
Segundo Garman, a única dúvida era sobre quem seriam os ministros no governo de Dilma. "Agora, acho que os investidores vão começar a olhar a eleição com um pouco mais de atenção", afirma.
"A política americana não é guiada apenas pela economia", diz o codiretor do Center for Economic and Policy Research, Mark Weisbrot. "Se fosse assim, haveria um empate entre os que preferem Dilma e os que preferem Serra."
"Grande parte dos empresários prefere a Dilma", acrescenta. "Ainda lembram do que Serra fez quando era ministro."
Em 2001, à frente da pasta da Saúde, Serra ameaçou quebrar a patente de medicamentos utilizados no "coquetel" para o tratamento do vírus HIV, como o Nelfinavir (fabricado pelo laboratório Roche) e o Efavirenz (do Merck Sharpe & Dohme), alegando alto custo para a compra dos remédios.
Com a ameaça, os laboratórios reduziram os preços, e as patentes foram mantidas. No entanto, em 2007, o presidente Lula determinou a quebra da patente do Efavirenz.
Sennes e Nogami concordam que o setor de saúde poderia ter uma resistência maior a uma eleição de Serra. Por outro lado, Nogami avalia que os setores voltados à infraestrutura veriam a vitória de Serra com bons olhos, por ter um perfil voltado ao setor produtivo.
O diretor da Prospectiva acrescenta que o tucano, considerando as suas declarações e a sua biografia, pode dar um "choque de competitividade" em diversas áreas como a de autopeças.
"Para Serra, um mercado bem regulado e com forte concorrência funciona melhor do que uma situação em que uma estatal esteja como linha dominante", afirma Sennes.* Colaborou Alessandra Correa, da BBC Brasil em Washington
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