O PT anda um pouquinho, recua um pouquinho, disfarça e volta a um assunto que lhe é especialmente caro: o poder do Estado de estabelecer algum tipo de controle sobre a imprensa.
Sexta-feira passada aconteceu mais uma reunião para o partido discutir a questão que tenta introduzir na agenda do País desde o início do primeiro mandato de Lula.
De lá para cá a abordagem do tema foi sendo adaptada, a fim de driblar resistências.
Hoje esse debate acontece sob a justificativa de que é necessário estabelecer "um novo marco regulatório para a mídia", mas em 2004 a mesma proposta foi apresentada ao País com sinceridade e nitidez.
Era preciso, na visão do partido que chegava ao poder, criar um órgão - o Conselho Federal de Jornalismo - para "orientar, disciplinar e fiscalizar" o trabalho dos meios de comunicação.
Na época, o PT ainda era estreante nas lides governamentais, não havia se iniciado com afinco na produção de escândalos em série e estava acostumado a ser paparicado por quase toda a grande imprensa da qual reclama, mas que até o caso Waldomiro Diniz dava ao partido e ao presidente Lula uma cobertura extremamente favorável.
Ao "presidente operário" tudo era permitido. Inclusive renegar o próprio discurso sem ser confrontado com rigor diante da contradição-mãe de chamar de herança maldita o legado do antecessor e, ao mesmo tempo, tirar dela o melhor proveito.
A partir dos tropeços do governo é que o cenário mudou. Mas não mudou no partido a ideia de exercer domínio sobre a grande imprensa, o único setor que lhe foge completamente ao controle. E é isso o que incomoda.
Por mais disfarçados que sejam os argumentos. Em artigo no jornal O Globo de ontem, o presidente do PT, Rui Falcão, lista alguns pontos que seriam alcançados pelo "marco regulatório".
Fala em "ferramentas eficazes de inclusão social e defesa da comunicação e cultura nacionais", na garantia do acesso universal à internet em banda larga, em mecanismos para "evitar que o poderio econômico dos grandes grupos de telefonia sufoque setores da mídia tradicional" e na ampliação de recursos para "grandes redes de radiodifusão pública e de telecomunicações".
Tudo muito decente. E vago. De substantivo mesmo, resta o resumo das intenções feito no seminário de sexta-feira pelo deputado cassado, réu do mensalão e dirigente do PT, José Dirceu: "Os proprietários de veículos de comunicação são contra nós, fazem campanha dia e noite contra nós. Só lamento que não haja um jornal de esquerda, que seja a favor do governo".
Há de todos os matizes no País todo: de esquerda, de direita, sem orientação, nos blogs, nos sites. Não falta espaço de comunicação em defesa do governo.
Mas há também os que exercem a crítica, e ao PT e sua pretensão à hegemonia desconforta essa convivência com o contraditório. Daí a insistência.
Vai levando. Crua e resumidamente, prevalece a seguinte visão no governo sobre o efeito das denúncias de corrupção na popularidade da presidente: enquanto a interpretação geral for a de que as demissões significam que Dilma é implacável, não há necessidade de bancar o risco de confrontação com a base mudando os critérios de ocupação de espaços.
E prossegue o raciocínio: como o noticiário de rádio e televisão favorece a essa conclusão, pois não se aprofunda na análise de que a presidente só demitiu por impossibilidade de não demitir, há margem para esticar a corda e evitar novas demissões.
Até que a reforma ministerial renove a imagem de uma Dilma ativa - e não reativa - face às deformações de origem nos critérios de composição da equipe de governo.
Resumo da ópera: quanto menos as pessoas alimentarem o hábito da leitura e quanto mais continuarem a se informar por meios cuja própria natureza remete à informação menos elaborada e desprovida de interpretação, melhor para o governo.
Embora seja bem pior para o desenvolvimento da massa crítica, sem a qual não se faz uma sociedade capaz de dialogar de igual para igual com o poder público.
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