sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Lula mente ao dizer que fundou o PT.

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Na verdade, Lula roubou o PT para poder roubar o Brasil. Conheça a verdadeira história aqui






A ascensão de Lula e do PT ao poder no Brasil não é um fenômeno recente e também não é algo que custou barato. Ao contrário do que muitos imaginam, o PT não surgiu nas raízes dos movimentos sindicais do ABC, mas sim nas cabeças de intelectuais burgueses que frequentavam os cafés de Paris na década 70.

O nome Partido dos Trabalhadores é explorado em diversos países, como Estados Unidos, (1938), Espanha (1984)  Colômbia (1977), México (1975), Panamá (1983), Peru, Reino Unido. Todos tiveram origens em inspirações comunistas.

No Brasil, o Movimento Convergência Socialista, derivado da Liga Operária, manifestou pela primeira vez a intenção criar um partido em 1978, por sugestão de Mário Pedrosa, um burguês comunista crítico de arte. A Liga Operária era uma agremiação composta por militantes da Ação Popular, do Partido Comunista Revolucionário e pelo Movimento Nacionalista Revolucionário. Em 1978, outros agrupamentos de esquerda, como o Movimento de Emancipação do Proletariado (MEP) já sugeriam a criação do PT durante o Congresso dos Metalúrgicos do Estado de São Paulo, em Lins.

Além das poucas intervenções de Mário Pedrosa, este projeto de criação do partido não tinha relação com outros movimentos de esquerda no Brasil e no exterior, que também almejavam a criação de um partido com a mesma nomenclatura. Neste período, Lula era apenas o "queridinho" dos donos de fábricas da região do ABC paulista e recebia cachês para apaziguar greves em outras regiões do país.

Mas o PT propriamente dito foi idealizado por um grupo de jovens comunistas ricos, não necessariamente fiéis à ideologia que estava na moda, amantes da boa vida e de cargos no exterior. Estavam todos encantados com a ascensão do líder polonês Lech Walesa, um operário  que se tornou um controverso ativista sindical. Durante anos, foi perseguido pelas autoridades, mantido sob vigilância do Estado, demitido em 1976 e preso várias vezes. No final dos anos 70, o líder sindical fundou o partido Solidariedade.

Assim como Lula, Walesa também concorreu à presidência de seu país no mesmo ano de 1989. A diferença é que o líder sindical polonês venceu a eleição de seu país a e cumpriu seu mandato entre 1990 e 1995. Lula fez o jogo da Globo para tirar Leonel Brizola do páreo e perdeu a eleição para Fernando Collor de Melo. Walesa ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1983. Lula passou a ganhar mesada de empresários ricos como Léo Pinheiro e Emílio Odebrecht, que o requisitava para sabotar movimentos grevistas em suas fábricas na Bahia, convencendo sindicatos e trabalhadores a fechar acordos que combinava com os patrões.

Voltando um pouco no tempo, os mesmos intelectuais burgueses que perambulavam pela Europa nos anos 70 acabaram "inspirados" pela ascensão de governos comunistas ao redor do mundo e com a trajetória do líder sindical da Polônia. Foi quando tiveram a brilhante ideia de trazer a "franquia" do modelo polonês para o Brasil.

O final dos anos 70 foi marcado pela revogação do AI5, um ato que cassou a liberdade política e suspendeu uma série de direitos democráticos durante os anos de chumbo da ditadura. A assinatura de sua revogação ocorreu precisamente no dia Em 13 de outubro de 1978, pelo então presidente da república, o General Ernesto Geisel após exatos dez anos em vigor. A revogação, que passaria a vigorar a partir de janeiro de 1979, deu início à abertura política no país. Foi um passo decisivo no processo de redemocratização do Brasil, conduzida pelos militares que julgavam ter livrado o país da ameaça dos comunistas.
A Lei da Anistia (Lei Federal n° 6.683, de 28/08/1979) foi promulgada logo após a revogação do AI5 pelo sucessor de Ernesto Geisel, o General João Baptista de Oliveira Figueiredo, que tomou posse em 15/03/1979. A Lei da Anistia contemplava qualquer cidadão envolvido em crimes políticos e permitiu o retorno ao Brasil de centenas de exilados políticos, como Leonel Brizola, Miguel Arraes, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Carlos Prestes, José Serra e do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho.

Este período marcou o retorno do pluripartidarismo ao Brasil, quando surgiram, a partir dos anos 80, partidos como o PTB, PDT, PP e PT. Antes, havia apenas dois partidos, que eram o MDB e ARENA. Destes partidos surgiram o PMDB e o PDS.
Sérgio Buarque de Holanda assinando a
terceira ficha de filiação do PT
Foi nesta época que os verdadeiros fundadores do PT viram a oportunidade de implantar no país a franquia polonesa, que não tinha nada a ver com os conceitos bolivarianos atuais. O grupo idealizador do PT era formado por gente como Sérgio Buarque de Holanda, Bruno Maranhão, que havia voltado do exílio na França em 1979, Antonio Candido de Mello e Souza, Paulo Delgado,  Florestan Fernandes, Mário Pedrosa (o da Liga Operária), Apolônio de Carvalho, Vladimir Palmeira, Lélia Abramo, Francisco Weffort, Plínio de Arruda Sampaio, Hélio Bicudo, entre outros. Lula ainda não estava na jogada.

Lula (direita) e outros sindicalistas barrados numa
das reuniões de fundação do PT no tradicional
colégio Sion, SP.
À exceção de Bruno Maranhão, o Partido dos Trabalhadores foi organizado por figuras predominantemente ilustres, intelectuais, burgueses e dissidentes católicos que àquela altura sabiam exatamente o que queriam: um líder popular para servir de fachada para o partido. De preferência um sindicalista. Esta pessoa seria o porta voz do partido, seria o rapaz do marketing, o interlocutor dos fundadores e porta voz de um plano de poder ambicioso.

Acompanhe no vídeo abaixo quando o ex-presidente Lula demonstra seu desprezo pelo líder sindical que inspirou o projeto de poder do PT. Sem demonstrar o menor escrúpulo, Lula confessa com todas as letras o que há por trás de sua chegada ao poder e como consegui passar muita gente para trás:





Foram várias reuniões em que eram avaliados perfis de líderes sindicais do país. Era quase um concurso de "Miss Proletariado". A opção inicial de um grupo foi o nome de Jair Antonio Meneguelli, homem de origem humilde, sem nível superior, líder sindical do ABC, grevista,  presidente do sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, enfim. Tinha o perfil idealizado pelos intelectuais fundadores do PT.
Jair Antonio Meneguelli e Lula
Outro grupo defendia o nome de Lula. homem de origem humilde, sem nível superior, líder sindical do ABC, grevista,  presidente do sindicato dos metalúrgicos São Bernardo do Campo e Diadema, tudo como mandava o figurino. O único problema é que Lula tinha a língua presa e isso não agradava alguns burgueses do partido, que preferiam Meneguelli.

Um dos fatores que pesaram contra o rival de Lula foi justamente seu sobrenome. Era meio italiano. Da Silva soava melhor aos ouvidos do povão. Foi exatamente por este critério que a escolha do garoto propaganda do PT recaiu sobre Lula. O sindicalista foi o escolhido para projetar o partido junto à classe trabalhadora. Os intelectuais preparavam seus discursos a partir dos postulados das velhas cartilhas comunistas, adaptadas ao marketing político moderno e com um tempero nordestino.

A trajetória do PT seguiu todos os procedimentos estratégicos clássicos das cartilhas comunistas, como a propagação de uma mensagem de libertação dos "oprimidos" do jugo da elite burguesa. O segredo do negócio era explorar "os coletivos". O passo a passo destas cartilhas implantadas em outros cantos do mundo é sempre o mesmo e visa basicamente angariar a simpatia de líderes e núcleos sociais. A tática consiste em métodos óbvios de aproximação com os movimentos sociais, comunidades campesinas, líderes comunitários, núcleos estudantis universitários, "pseudo intelectuais" maconheiros, revolucionários, artistas alternativos e sem talentos, as minorias em geral. As técnicas de manipulação de massas "oprimidas" são velhas conhecidas. A cartilha aborda ainda o aparelhamento da máquina pública a partir da conquista de pequenas prefeituras e governos de estado, a cooptação dos funcionários públicos a partir do controle dos sindicatos, a tolerância com faltas, atrasos e a negligência de servidores. enfim.

O canto da sereia era sempre o mesmo: de forma generalizada, culpar pessoas bem sucedidas; a classe capitalista; explorar o sentimento de inferioridade de uma classe, voltando-a contra as elites; culpar os Estados Unidos pelas mazelas do Brasil; culpar a Globo pelo golpe militar e toda aquela cantilena marxista leninista (linha de pensamento político que combina os conceitos de imperialismo e centralismo democrático e a mudança de foco revolucionárioque todos os brasileiros conhecem muito bem. Afinal, são 37 anos ouvindo Lula e o pessoal do PT contando a mesma historinha que não deu certo em lugar nenhum do mundo.

Mas o fato é que nada disso saiu da cabela de Lula. Estas lições são fruto de um aprendizado secular de estratégias que saíram das mentes de comunistas brilhantes. Os métodos constantes das cartilhas comunistas foram usadas em outros cantos como Cuba, Venezuela, México e em vários países da África e ásia. O mérito de Lula foi o de assimilar com maestria todas estas lições. Lula aprendeu a arte da retorica metafórica futebolística, a arte de destruir reputações. Lula se tornou mestre do ilusionismo e aperfeiçoou sua habilidade de vender o que jamais poderia entregar. Lula foi instruído a prometer a redenção da classe trabalhadora, que um dia ainda iria prevalecer sobre as "zelites" e pisar na cabeça dos burgueses.

O plano dos ilustres fundadores do PT era o de poupar Lula de qualquer cargo executivo, como prefeito ou governador, por uma simples razão: todos sabiam que ele não tinha competência para governar e que um fracasso à frente de alguma prefeitura, assim como foi sua passagem pelo legislativo, o queimaria para o plano maior.
Lula falando no plenário
da Câmara dos Deputados
Eleito deputado federal por São Paulo em 1986, lula obteve uma média medíocre, segundo o Ipea. Foi favorável à limitação do direito de propriedade privada, ao aborto, à jornada semanal de 40 horas, à soberania popular, à estatização do sistema financeiro, a ampliação da reforma agrária, taxação de grandes fortunas, era contra a privatização de estradas, cobranças de pedágios, contra o lucro extorsivo dos bancos e tudo aquilo que continua do mesmo jeito no Brasil, após 14 anos com o PT no poder.

Durante sua trajetória política de quase 40 anos, o convívio de Lula com  os pobres e representantes da classe trabalhadora ficaram restritos aos comícios  e no corpo a corpo das campanhas eleitorais. Por outro lado, Lula conviveu intensamente com o membros do alto escalão do partido, formado por gente da elite, burgueses, intelectuais, empresários e financiadores de suas campanhas. Com essa gente, Lula adquiriu hábitos e gostos sofisticados. Aprendeu a amar os jatinhos, seguranças, ternos italianos, hotéis de luxo, bons vinhos, boa gastronomia e tudo que o dinheiro pode comprar.


Lula seguiu à risca as instruções de seus amestradores.

Após décadas de investimento no projeto "Lula", o sindicalista evolui com o passar dos anos de aprendizado e conseguiu se adaptar as mudanças do cenário político nacional. Lula se mostrou capaz de atender a interesses corporativos dentro da estrutura partidária. Se revelou habilidoso nas negociações com grandes empresários e banqueiros. Desenvolveu maior traquejo com adversários políticos e conseguiu angariar a simpatia de vários setores da sociedade.

O projeto de chegada do PT ao poder  sempre teve como foco central a eleição de Lula. Sua "imagem" foi o centro de todos os investimentos e esforços do partido. Aos integrantes, membros e militantes, era imposto o compromisso de enaltecer sua figura em qualquer oportunidade. A imagem de Lula deveria ser associada a todas as candidaturas do partido, desde os candidatos a vereador de pequenos municípios até espaços generosos nas  grandes campanhas de deputados, senadores, prefeitos e governadores.

Durante anos, todos no partido foram obrigados a pronunciar o nome de Lula em entrevistas, comícios, palestras e eventos públicos. Ao longo dos últimos 36 anos, o PT rouou e torrou bilhões de dólares para projetar a figura de seu líder máximo. Aquele que garantiria a ocupação duradoura do poder central do país durante décadas. Aquele que deveria se tornar um mito tão poderoso, que seria um dia capaz de eleger qualquer candidato a qualquer cargo em qualquer lugar do país.

Após décadas de investimentos e três tentativas consecutivas fracassadas, o PT finalmente chegou ao poder com Lula justamente no momento mais favorável economicamente do Brasil em toda a história. Lula chegou ao Palácio do Planalto em janeiro de 2003 com a inflação debelada e moeda estável, fatores preponderantes que favoreciam a ampliação da distribuição de renda.

Milhares de empresas em todo o mundo foram atraídas pela estabilidade econômica e a inserção do país nas regras de livre mercado providenciadas por seu antecessor, como preços e câmbio livres, regras fiscais e tributárias claras, lei de responsabilidade fiscal e garantia de remessas ao exterior. Ao assumir seu primeiro mandato, Lula encontrou cerca de 350 mil empresas em processo de instalação no Brasil, como Honda, Toyota, Peugeot, Renault, Hyundai, WalMart, LG, Samsung, John Deer e outros players gigantes do mundo globalizado. Estas empresas gerariam cerca de 18 milhões de empregos durante os dois mandatos de Lula.

Como se não bastasse a sorte de assumir seu primeiro mandato em pleno aquecimento do mercado interno, quando a população já comprava carros, imóveis e outros bens duráveis financiados a longo prazo, Lula ainda deu sorte com o alto valor das commodities no mercado internacional. Itens como aço, soja e petróleo nunca alcançaram valores tão altos em toda a história mundial. Isso justamente durante o período de maior crescimento da economia chinesa, que alavancou a economia mundial durante mais de uma década.

Governar o Brasil sob tais condições era mais fácil do que bater um prego na manteiga. Como não enfrentou grandes desafios na economia e na geração de empregos, Lula se dedicou a organizar os esquemas criminosos que financiariam as campanhas do partido dali em diante e começou a se livrar dos intelectuais "chatinhos" que enfrentavam resistência no partido. Esperto, se aproveitou da vulnerabilidade de algumas posições na legenda, colocou o PT no bolso e seguiu em frente.

O partido sempre enfrentou uma divisão interna formada pelos idealistas e os revolucionários. Os idealistas eram justamente os intelectuais burgueses fundadores do partido. Já os revolucionários eram os guerrilheiros pobres que assaltavam bancos, roubavam caminhões de carne para fazer churrasco e faziam treinamento de guerrilha em Cuba durante a ditadura. Lula deu um jeito de se livrar dos idealistas e ficou só com a banda podre do partido. Foi desta forma que Lula roubou o PT das mãos de seus idealizadores.

Logo que chegou ao poder, já totalmente descaracterizado, o partido se revelou uma grande organização criminosa e levou para Brasília a pior geração de corruptos que os brasileiros já tiveram notícia. Ao longo de 14 anos, o PT colocou em prática toda sua experiência acumulada em aparelhar e dilapidar a máquina estatal. Roubou, desviou e deixou desviar mais dinheiro que todos os políticos de toda a história do pais roubaram juntos em 517 anos de história. Lula e o PT corromperam políticos, empresários, diretores de estatais e juízes com uma facilidade que chocou o mundo a partir do levantamento dos sigilos dos executivos da Odebrecht.

Enquanto permaneceu no poder, o PT promoveu um gigantesco esquema de aparelhamento do Estado em nível nacional e internacional. Estava finalmente tudo dominado. O ideal de um grupo de intelectuais burgueses concebido nas mesas dos cafés de Paris 40 anos atrás se distorceu, se descaracterizou, mas finalmente prevaleceu. O mais ambicioso plano do poder político de que se tem notícia na história do país foi finalmente implantado pelo PT no Brasil e teve continuidade, através de Dilma Rousseff, a sucessora cúmplice da bandidagem do partido.

Lula pode ser considerado o maior ladrão do Brasil, já que ao lado da Odebrecht, OAS, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Friboi, EBX de Eike Batista entre outros comparsas, "aliviou" os cofres públicos em mais de R$ 500 bilhões em 13 anos.

Estava tudo indo muito bem. Até que surgiu um rapaz do Paraná que destruiu em poucos meses tudo aquilo que Lula e sua gangue do PT gastaram quatro décadas para construir. O juiz federal Sérgio Moro simplesmente aniquilou a organização criminosa que se instalou no coração da República para assaltar o país. Moro desbaratou a quadrilha e enquadrou todos seus representantes com apenas algumas etapas da Operação Lava Jato. 

De nada adiantou o PT roubar tantos bilhões do povo para investir em tanta farsa chamada Lula. Foi tudo parar no lixo da história no final da história.



Fonte: https://www.imprensaviva.com/2017/04/lula-mente-ao-dizer-que-fundou-o-pt-na.html?fbclid=IwAR0Tjs8qgFZla3OON2TlxokqaQxUISTju-oHRdPl_d5RE1Sw1kdyusMmbTY
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segunda-feira, 10 de setembro de 2018

A verdade dividida – Carlos Drummond de Andrade

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A porta da verdade estava aberta
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só conseguia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia os seus fogos.
Era dividida em duas metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era perfeitamente bela.
E era preciso optar. Cada um optou
conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.


(Carlos Drummond de Andrade, in Contos Plausíveis)
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domingo, 9 de setembro de 2018

A Geração do Nada Pode e sua Hipocrisia Social

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O avanço da tecnologia, o amplo alcance das redes sociais e o predomínio de uma intensa hipocrisia social estão formando gerações de crianças e jovens que baseiam seus posicionamentos em meros achismos, que não respeitam os mais velhos, que menosprezam valores fundamentais e que acham que podem literalmente mandar em seus pais.

A chamada Geração Hipocrisia do século XXI está pronta para compartilhar tudo nas redes sociais, mas não está preparada para reflexões e para se comprometer com causas maiores. É uma geração que valoriza o número de visualizações no Youtube, que se importa com o poder da imagem e do culto ao corpo, mas é incapaz de se envolver com o próximo.

Vivemos um tempo repleto de contradições, no qual os pais temem educar seus filhos com rigor, são extremamente permissivos e, muitas vezes, não são capazes de transmitir valores importantes aos jovens, como tolerância, respeito, compaixão e amor ao próximo. Ao mesmo tempo, vivemos uma época onde o politicamente correto está forte, onde os paladinos da justiça social estão sempre prontos para atacar os outros atrás da tela de um computador e onde as relações sociais estão rasas, ou seja, sem profundidade. Falta empatia, sensibilidade e conhecimento.

A internet revela as hipocrisias diárias da sociedade. Tudo o que vemos nas redes é simplesmente um retrato fiel de uma sociedade que é incapaz de se sensibilizar com o sofrimento de quem está nas ruas, mas que está sempre pronta para julgar.

É como se passássemos por uma falência generalizada de nossos valores, fazendo reinar a desesperança e a violência. Vivemos a época da cegueira moral e da hipocrisia covarde.

Além disso, essa geração também é representada pela banalização, pela perda de boas referências, pela falta de leitura e senso crítico e pelo esvaziamento do pensamento. Basta analisar o significado da palavra hipocrisia para notar como a sociedade está em um caminho preocupante, marcado pela falsidade, pela dissimulação, pelo fingimento e pelo desvio de caráter.

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domingo, 26 de agosto de 2018

Mentiras

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Tu julgas que eu não sei que tu me mentes 
Quando o teu doce olhar pousa no meu? 
Pois julgas que eu não sei o que tu sentes? 
Qual a imagem que alberga o peito meu? 

Ai, se o sei, meu amor! Em bem distingo 
O bom sonho da feroz realidade... 
Não palpita d´amor, um coração 
Que anda vogando em ondas de saudade! 

Embora mintas bem, não te acredito; 
Perpassa nos teus olhos desleais 
O gelo do teu peito de granito... 

Mas finjo-me enganada, meu encanto, 
Que um engano feliz vale bem mais 
Que um desengano que nos custa tanto! 



Florbela Espanca - "A Mensageira das Violetas" 
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domingo, 12 de agosto de 2018

TESTAMENTO DE UM IDOSO

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Um jovem advogado foi indicado para inventariar os pertences de um senhor recém falecido. 
Segundo o relatório do seguro social, o idoso não tinha herdeiros ou parentes vivos. Suas posses eram muito simples. O apartamento alugado, um carro velho, móveis baratos e roupas puídas. “Como alguém passa toda a vida e termina só com isso?” - pensou o advogado. 
Anotou todos os dados e ia deixando a residência, quando notou um porta-retratos sobre um criado mudo.
Na foto estava o velho. Ainda era jovem, sorridente, ao fundo um mar muito verde e uma praia repleta de coqueiros. À caneta escrito bem de leve no canto superior da imagem lia-se “sul da Tailândia”. 
Surpreso, o advogado abriu a gaveta do criado e encontrou um álbum repleto de fotografias. Lá estava o senhor, em diversos momentos da vida, em fotos em todo canto do mundo.
Em um tango na Argentina, na frente do Muro de Berlim, em um tuk tuk no Vietnã, sobre um camelo com as pirâmides ao fundo, tomando vinho em frente ao Coliseu, entre muitas outras. 
Na última página do álbum um mapa, quase todos os países do planeta marcados com um asterisco vermelho, indicando por onde o velho tinha passado. Escrito à mão no meio do Oceano Pacífico uma pequena poesia:

Não construí nada que me possam roubar.
Não há nada que eu possa perder.
Nada que eu possa tocar,
Nada que se possa vender.
Eu que decidi viajar,
Eu que escolhi conhecer,
Nada tenho a deixar
Porque aprendi a viver..
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(Desconheço o autor)
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sexta-feira, 10 de agosto de 2018

O que significa “No frigir dos ovos”?

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Não é à toa que os estrangeiros acham nossa língua muito difícil. Como a língua portuguesa é rica em expressões!

Veja o quanto o vocabulário “alimentar” está presente nas nossas metáforas do dia-a-dia. Aí vai.


Pergunta:
– Alguém sabe me explicar, num português claro e direto, sem figuras de linguagem, o que quer dizer a expressão “no frigir dos ovos”?


Resposta:

– Quando comecei, pensava que escrever sobre comida seria sopa no mel, mamão com açúcar.
Só que depois de um certo tempo dá crepe, você percebe que comeu gato por lebre e acaba ficando com uma batata quente nas mãos. 


Como rapadura é doce mas não é mole, nem sempre você tem idéias e pra descascar esse abacaxi só metendo a mão na massa. E não adianta chorar as pitangas ou, simplesmente, mandar tudo às favas. 

Já que é pelo estômago que se conquista o leitor, o negócio é ir comendo o mingau pelas beiradas, cozinhando em banho-maria, porque é de grão em grão que a galinha enche o papo.

Contudo é preciso tomar cuidado para não azedar, passar do ponto, encher linguiça demais. Além disso, deve-se ter consciência de que é necessário comer o pão que o diabo amassou para vender o seu peixe. 


Afinal não se faz uma boa omelete sem antes quebrar os ovos. 

Há quem pense que escrever é como tirar doce da boca de criança e vai com muita sede ao pote. Mas como o apressado come cru, essa gente acaba falando muita abobrinha, são escritores de meia tigela, trocam alhos por bugalhos e confundem Carolina de Sá Leitão com caçarolinha de assar leitão.

Há também aqueles que são arroz de festa, com a faca e o queijo nas mãos, eles se perdem em devaneios (piram na batatinha, viajam na maionese… etc.). Achando que beleza não põe mesa, pisam no tomate, enfiam o pé na jaca, e no fim quem paga o pato é o leitor que sai com cara de quem comeu e não gostou. 


O importante é não cuspir no prato em que se come, pois quem lê não é tudo farinha do mesmo saco. 

Diversificar é a melhor receita para engrossar o caldo e oferecer um texto de se comer com os olhos,
literalmente. 


Por outro lado se você tiver os olhos maiores que a barriga o negócio desanda e vira um verdadeiro angu de caroço. Aí, não adianta chorar sobre o leite derramado porque ninguém vai colocar uma azeitona na sua empadinha, não. O pepino é só seu, e o máximo que você vai ganhar é uma banana, afinal pimenta nos olhos dos outros é refresco…

A carne é fraca, eu sei. Às vezes dá vontade de largar tudo e ir plantar batatas. Mas quem não arrisca não petisca, e depois quando se junta a fome com a vontade de comer as coisas mudam da água pro vinho.

Se embananar, de vez em quando, é normal, o importante é não desistir mesmo quando o caldo entornar. Puxe a brasa pra sua sardinha, que no frigir dos ovos a conversa chega na cozinha e fica de se comer rezando. Daí, com água na boca, é só saborear, porque o que não mata engorda.


Entendeu o que significa “no frigir dos ovos” ?”




(desconheço o autor)
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quinta-feira, 9 de agosto de 2018

Cinderela moderna

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Cinderela vivia com sua mãe num apartamento confortável perto da estação Santana do metrô.Suas únicas preocupações eram: ir ao colégio e pesquisar o que iria fazer no próximo final de semana.Toda noite quando a mãe chegava do trabalho perguntava o que ela tinha feito, e lá vinha ela com uma porção de reclamações.Era o barulho das crianças do prédio, era a falta de mesada para ir ao shopping, era reclamações e mais reclamações, a mãe já não suportava mais.

Tudo piorou num final de semana em que a mãe foi viajar. 

A jovem Cinderela, se achando dona do pedaço, convidou a turma para uma festinha no apê. Adivinha! Foi muito mais gente do que o previsto e a Cindy (assim as colegas a chamavam) perdeu o controle da situação e o apartamento foi praticamente destruído! 

Sofás manchados, armários quebrados, piso arranhado, cortinas e tapetes rasgados e manchados, um verdadeiro caos. Quando a mãe chegou de viagem ficou possessa e mandou que ela fosse morar com o pai.

Ela exultou! Era isso mesmo que ela queria , lá ela teria a liberdade sonhada.O pai meio a contragosto levou-a para a casa. Arrumou um quarto para ela nos fundos da casa, visto que os dormitórios já tinham donas que não queriam abrir mão deles, eram as filhas de sua madrasta, Isabel e Isadora.

A partir desse dia, Cinderela perdeu as regalias que tinha com sua mãe, passou a lavar e a passar a própria roupa e a cozinhar para si. As enteadas do seu pai não gostavam dela e não queriam a sua amizade, assim ela passou a conversar com o gato e o cachorro da casa.

Isabel e Isadora saiam todo dia para o shopping e compravam roupas finas e caras, enquanto Cinderela tinha que se arranjar com a mesada que seu pai lhe dava.

O pai não lhe fazia companhia, nunca estava presente, sempre trabalhando além do horário para sustentá-las 

Um dia o pai chegou com uma boa noticia: O filho do dono da empresa estava se formando em engenharia e iria dar uma festa para comemorar a formatura e também o seu aniversário.

As irmãs ficaram empolgadíssimas, pois era a oportunidade que esperavam para dar o golpe do baú e continuarem com suas vidas ociosas e sem perspectivas.

Correram logo para as compras , procurando por belas roupas e sapatos.

Cindy começou a pesquisar preços pois com sua mesada não iria poder comprar roupas de grife assim como as irmãs.

Reclamava ao gato:

-Não sei o que fazer, tenho que ir a essa festa e não tenho uma boa roupa, será que alguém pode ajudar-me?

O gato miava e lambia-se, não tinha noção do que a menina falava.

Uma senhora que passava pela rua, ouviu os lamentos de Cinderela e chamou-a.

_Tenho exatamente o que precisas, venha à minha casa.

Chegando lá a mulher lhe mostrou várias roupas lindas, pois era modista de uma famosa confecção.

_Posso emprestar-te uma destas roupas mas terás que devolvê-la antes da meia noite.

Cinderela dava pulinhos de alegria, pegou a mais bela roupa e foi para casa esperar a hora da festa.

Isabela e Isadora estavam todas emperiquitadas ao lado da madrasta, quando Cinderela chegou à festa num táxi que a trouxe e logo foi embora.

Todos olhavam para aquela bonita moça que chegara. Até o aniversariante ficou encantado com ela.

Todos dançaram e se divertiram muito, porém, perto da meia noite, o rapaz chamou a todos para anunciar que tinha achado a mulher de sua vida. 
Era uma amiga que havia conhecido na faculdade e que também estava se formando. Uma moça meiga, delicada, trabalhadora e eles pretendiam se casar em breve.

Ao ouvir isso, Cinderela percebeu que não iria tirar vantagem e como já estava chegando a meia noite, correu para devolver emprestada.

Ao passar ligeiro pela porta, enganchou a roupa na maçaneta e rasgou-a. Foi descer as escadas, torceu o pé e perdeu o sapato.

Conclusão, teve que trabalhar para a senhora da confecção até descontar o preço do sapato e das roupas. 

Suas irmãs preguiçosas também tiveram que ralar, pois sem o golpe do baú ficava difícil pagar as prestações das roupas de grife e a madrasta foi ser manicure num salão de beleza, já que o marido de tanto trabalhar para sustentar as preguiçosas, ficou doente e perdeu o emprego.

Moral da história: Arregace as mangas, estude, trabalhe e corra atrás do que deseja, pois até os contos de fada já não são mais os mesmos!



Wanda Wenceslau - Fonte: https://www.recantodasletras.com.br/contosdefantasia/1766272

Eu me lembro

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“Deus. Eu me lembro! Eu me lembro! – Era pequeno…” Os versos de Casemiro de Abreu ressoam em mim como os grossos pingos da chuva batendo na lata da única peça da casa que não era coberta com capim Santa Fé. Eu me lembro, eu me lembro, era pequeno, de tudo o que vivemos e que não sabíamos ser nosso destino. Um presente enraizado no passado do qual só conseguiríamos nos arrancar pela força dos livros. Eu me lembro da geada, do vento sibilando nas frestas, do fogo no galpão, das estradas encharcadas nos longos invernos, do barro vermelho no Alto Grande, dos muito pobres pedindo esmola num lugar onde todos tinham muito pouco a oferecer. Eu me lembro, era pequeno.

Sim, eu nunca esqueci. Eu me lembro, era pequeno, dos primeiros dias na cidade, do medo da novidade, de tantos “autos” passando sem parar. Eu me lembro da vida no campo, do latifúndio a perder de vista, da pobreza de quase todos, da luz da lamparina bruxuleando nas noites sobre as letras trêmulas das lendas do Sul, das madrugadas que prometiam uma vida nova e traziam a cada dia a velha desigualdade. Da janela, vendo a chuva que parecia eterna, eu via a nossa sorte selada. Era preciso se arrancar dali puxando-se pelos próprios cabelos. Só a passagem do trem a cada dia prometia outra vida, outra estação. O sonho era uma locomotiva vermelha abrindo algum caminho para o futuro.

Claro que eu me lembro, era pequeno, da inveja que sentíamos do dono do lugar, que passava solene na sua camioneta de motor ronronante. Éramos 301. Divididos em dois grupos: ele e nós. Meu bisavô fora estancieiro. Meu avô, dono de uma chácara. Meu pai, cabo da Brigada Militar, cujo grande sonho era ter um pedacinho de terra para chamar de seu. Eu me lembro, era pequeno, dos seus sonhos, dos “causos” que nos contava sobre assombrações, cavalos ligeiros, jogos de truco, tiroteios, do seu amor pelos animais, da sua luta cotidiana para abraçar o horizonte, que sempre se afastava como a enormidade das terras de tão poucos donos. Por que nunca paro de me lembrar? Não sei.

É do cair das noites que eu mais me lembro, era pequeno, trazendo medo e melancolia, fantasmas e desesperanças, mais frio e vento assobiando. Eu me lembro das nossas sombras desenhadas nas paredes, da minha japona nova, azul e sintética, pegando fogo da lamparina, comigo dentro, das caixas de lápis de cor, do terror que era sair à noite para ir à “patente” no fundo do pátio, do canto dos galos anunciando um novo dia de labuta e de esperança para todos. Mas eu me lembro também, felizmente, das noites de verão coalhadas de estrelas, da algaravia dos pássaros na primavera, dos pomares coloridos de frutas maduras, do arco-íris emendando coxilhas, das nossas pandorgas enfeitando o céu anil nas manhãs da Semana Santa.

Eu me lembro, era pequeno, dos velórios nas pequenas salas onde ninguém se sentava, com um pano branco na porta e o caixão saindo pela janela. Eu me lembro das carreiras de cancha reta, dos bailes de galpão, das campereadas antes do sol se incendiar no céu, das águas irisadas de frio nos açudes de beira de estrada, das bergamoteiras quase vergadas sob o peso das frutas, do cheiro de melão maduro nas lavouras, do coração vermelho das enormes melancias que vendíamos na BR. Quando um carro parava, vibrávamos como se fosse um gol do 14 de Julho, o Leão da Fronteira.

Por que nunca canso de me lembrar disso?

Sim, eu também me lembro dos políticos da ditadura arrebanhando homens e mulheres nas carrocerias abertas de camionetes para que votassem pela ARENA e não deixassem o comunismo tomar conta do país. E o comunismo vinha sempre junto com o nome de Jango, que, às vezes, era chamado de Jango Goulart ou de João Goulart, e de Leonel Brizola. Eu me lembro que para insultar alguém a primeira palavra que vinha era tupamaro. Eu me lembro, era pequeno, de um homem falando no pátio da escola sobre a natureza de todas as coisas. Cada um tinha na vida, segundo ele, o que o seu destino lhe reservara. Era preciso se conformar ou trabalhar muito para ter mais, mas nunca querer dividir as terras dos outros mesmo que elas fossem enormes e improdutivas.

Ele não dizia improdutiva. Eu me lembro, era pequeno, ele falava “mesmo que elas estejam em repouso por algum tempo”. Era um advogado. Eu me lembro do seu bigode aparado com esmero e de um lencinho azul num bolsinho frontal do seu casaco, que ele chamava de paletó. Tudo o que aprendo hoje, esqueço. A minha memória está abarrotada pelas lembranças obsessivas daqueles tempos. Do que eu mais me lembro? Do contraste entre pobreza e riqueza, que eu não entendia e não podia discutir. Eram tantos ranchinhos, tanta casinha pobre, tanto puxadinho e tanto campo num silêncio sepulcral. Só os livros me despertavam. Ciro Martins foi o primeiro a me cutucar: “Que paz naqueles campos!”

Confesso, eu me lembro, era pequeno, quando tudo se calcifica na memória, na alma e no imaginário, de tudo o que me confundia. Havia tanto ar, tanto pasto, tanto céu e tanta mão calejada sem colher à altura do que plantava para outros. Custei a compreender o que via. O que eu via? Aquilo que sonhava.


Juremir Machado da Silva - Fonte: http://www.correiodopovo.com.br/blogs/juremirmachado/2018/03/10765/cronica-eu-me-lembro
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A MULHER FINGIDA

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“Do ponto de vista do homem, a grande mulher é a fingida. A mulher fingida tem sentimentos muito mais intensos e transbordantes que a mulher sincera.

A mulher sincera é sempre a mesma: ela é o que é. Já a mulher fingida é sempre o que o homem quer que ela seja.

Supondo-se que a mulher, assim afirmam os sexólogos, como o goleiro no futebol, só atinge o primeiro orgasmo aos 29 anos, a mulher sincera relata, até essa libertação, seu calvário, enquanto a fingida se comporta como se, desde as primícias da relação sexual, conseguisse êxtases retumbantes.

A mulher sincera é a que acorda o homem para a dura realidade. A mulher fingida é a que desperta o homem para o reino da fantasia. A mulher sincera encarrega-se sempre do pesadelo, a fingida catapulta o homem para o sonho.

A mulher sincera é aquela que, quando o homem chega em casa e pergunta se está tudo bem, responde ajeitando a camisola:”Agora vai ficar ainda melhor.”

A mulher sincera cobra, a mulher fingida promete. Da mulher sincera o homem só obtém muxoxos rançosos. Nos lábios da mulher fingida sibilam murmúrios de lascívia.

A mulher sincera faz sexo. A mulher fingida realiza uma apresentação. A mulher fingida tem orgasmo múltiplo. A mulher sincera, cosquinhas. A mulher sincera dá só vazão à queixa, à recriminação e à condenação. À mulher fingida passa sempre despercebido o deslize do homem. 

Para a mulher sincera, o homem, por mais que se esmere em provê-la, é um doador de esmolas. A fingida, por mais avarento que o homem lhe seja, considera-o um exemplo de prodigalidade.

A mais autêntica e atraente manifestação feminina é o fingimento. A mulher finge que é alta no salto do sapato e que seu rosto é sempre belo pela maquiagem. E seu corpo aromático pelo perfume e bem torneado pelas calças justas. E finge seios opulentos com o silicone.

A mulher sincera vive no médico e no dentista. A mulher fingida mora na sauna e no salão de beleza. A mulher sincera é lamurienta e pessimista. A fingida é afetada, coquete e otimista, profissional do sorriso e das carícias. A mulher sincera é um personagem, a fingida, uma atriz. 

Se está tudo bem na relação conjugal, tanto a mulher sincera quanto a mulher fingida se mostram realizadas. Mas a mulher fingida leva a vantagem de também se sentir realizada quando tudo se depara adverso ao casal. A mulher fingida aprimora a técnica de só se mostrar aborrecida quando está longe de seu homem. A sincera deixa para revelar o auge da melancolia e da irritação quando seu homem está presente.

De tanta admiração que ela tem pelo homem, as amigas da mulher fingida sentem-se invejosas dela. Para as amigas da mulher sincera chega a ser surpreendente que não se separe do marido, tantas são as críticas que ela lhe destina.

Eu amo a sinceridade da mulher fingida. E acho que é tão chata e exagerada a sinceridade da mulher sincera que ela só pode estar fingindo.”



Paulo Sant’Ana - Revista Época Nº121 (11/09/2000)
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segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Crônica de uma morte anunciada - Resumo

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O livro Crônica de uma morte anunciada, escrito por Gabriel García Márquez, publicado em 1981, conta, na forma de uma reconstrução jornalística, o último dia de vida de Santiago Nasar, num quebra-cabeças envolvente cujas peças vão se encaixando pouco a pouco através da superposição das versões de testemunhas que estiveram próximas ao protagonista. 

É a história do assassinato de Santiago Nasar pelos dois irmãos Vicario, sem chance de defesa. No romance, quase todos os habitantes do lugarejo onde vive Santiago, ficam sabendo do homicídio premeditado algumas horas antes (daí o título), mas não fazem nada de concreto para proteger a vítima ou impedir os algozes.

O objetivo da obra é o de criticar a mentalidade primitiva que permite que um assassínio premeditado tenha uma pena irrisória – independentemente da sua execução ter ou não sido pressionada pelo costume – e que uma jovem seja violentamente penalizada por não ter o comportamento sexual esperado para a época.

Por outro lado, a intenção é também a de demonstrar a consternação face à incrível quantidade de coincidências funestas acumuladas que deixam no ar a inquietante reflexão de que "a fatalidade torna-nos invisíveis".

O livro também trata do perdão e do tempo, da brevidade da vida e da eternidade dos sentimentos.

García Márquez em Crônica de uma morte anunciada, apesar de relatar os fatos de forma objetiva e sem grandes divagações, não deixa de recorrer aos sonhos premonitórios e aos presságios, como que para reforçar o caráter intuitivo quer do narrador/autor, quer das restantes personagens. O ambiente é mostrado como potenciador das emoções, sugerindo determinados estados de alma que, associados a uma capacidade de observação e de ligação de detalhes muito superior à média, se manifesta numa capacidade, também muito superior, de entendimento que muitos tendem a classificar como algo de sobrenatural ou mediúnico.

É deste modo que o autor descreve o dia da morte de Santiago como um dia em que fazia um tempo fúnebre e que no preciso instante da desgraça caía uma chuva miúda como a que Santiago Nasar vira no bosque, no sonho – chuva que era, na realidade, excremento de pássaro (segundo o autor, sonhar com pássaros é sinal aziago). Também a irmã do narrador – Margot – afirma que sentiu passar um anjo quando Santiago falou acerca do seu próprio casamento, fato que não se chegou a realizar.

Outro sinal de presença do incrível é a forma que García Márquez dá ao remorso como punição para o crime e a negligência. O cheiro de Santiago moribundo impregna-se de tal forma nas narinas daqueles que, de alguma forma tiveram o mais leve resquício de culpa, direta ou indireta, na sua morte atacando-lhes as consciências como o mais cruel dos fantasmas. O aguilhão do remorso cai, sobretudo, nos dois assassinos durante o relativamente curto espaço de tempo que passam na cadeia pagando pelo crime, perdendo, inclusive, a faculdade de controlar o próprio corpo, mas sempre sem perder a lucidez.

Apesar de tudo, é Bayardo quem, para a maioria da população, é visto como a maior vítima.

Para recontruir a estória da morte de Santiago Nasar, García Márquez recorreu não só à memória mas também a entrevista das pessoas envolvidas – aqueles que estavam, na altura, mais próximos não apenas da vítima mas também dos assassinos, tentando compor o puzzlle constituído pelos estilhaços da memória.

A partir da morte de Santiago Nasar, são desvendadas as perspectivas e as histórias de algumas pessoas que de uma forma ou de outra, estiveram ligadas à sua morte. Pois, como já citado, a morte de Santiago, foi anunciada por toda a vila de Riohacha, apenas ele, permaneceu na ignorância até ao momento em que foi esfaqueado à porta de casa.

Gabriel García Márquez retrocede e avança no tempo, fazendo do narrador participante o cronista da tal morte anunciada. Desde o talhante à empregada do café. Do padre ao delegado da polícia, todos sabiam muito antes de morrer, que Santiago tinha Pedro e Pablo à sua espera, com as facas afiadas dos porcos. No entanto, por medo, receio, covardia, comodismo, ou mero sadismo, ninguém avisou Santiago, preferindo antes observá-lo, inocente, ingênuo, caminhando impávido e sereno para a morte.

Personagens principais

Santiago Nasar, o protagonista, é filho de um rico emigrante árabe. Sedutor, culto, adepto da caça de altanaria, é apreciador de cavalos, armas e, claro, aves de presa. Já na aparência, Nasar assume o aspecto físico muito semelhante ao do autor – vestia um fato de linho lavado só com água por não suportar o estalar da goma em contacto com a pele, cabelos crespos e pálpebras árabes. 

Mas o que mais impressiona nesta personagem é a sua extrema solidão, característica comum a todos os heróis da ficção de García Márquez, tal como o próprio autor se encarrega de frisar em O Aroma da Goiaba

Nasar, apesar de sociável - tem amigos e um considerável número de pessoas que o estimam -, pauta a sua conduta por uma quase que excessiva reserva, uma independência de movimentos, constituída por um conjunto de atividades solitárias que levam a que as pessoas o deixem cultivar o prazer da sua solidão, da sua redoma, onde só cabe aquilo que comporta a sua imaginação. E é precisamente esta característica que o torna vulnerável e que faz com que passe ao lado de todas as tentativas levadas a cabo pelos outros para impedirem a sua morte: o seu alheamento, por um lado, e a indiferença dos menos íntimos a quem os mais chegados delegaram alguma tarefa no sentido de lhe fazerem chegar a informação.

Já Bayardo San Román, o anti-herói, é uma personagem que, desde o início, desperta a desconfiança de todos. Forasteiro e com um passado nebuloso envolto em mistério, provoca a curiosidade da população local e suscita a proliferação dos mais extravagantes boatos. 

Tem um aspecto algo efeminado, devido às roupas que usa – sempre muito justas e num tom amarelado. Os olhos são dourados – cor que García Márquez associa à vulgaridade e à corrupção por estar diretamente identificada com o ouro, ou seja, com o desejo de ostentação por um lado e com a avareza pelo outro. O seu comportamento extravagante na forma como exibe o poder de compra conquista a família de Angela – família que vê nele uma porta de saída de uma vida pautada pela penúria.

Curiosamente, Bayardo é o filho de Petronio San Román, o general conservador que derrotou o coronel Aureliano Buendía e disparou pelas costas contra Gerineldo Márquez em Cem Anos de Solidão – o que lhe granjeia forte impopularidade aquando da sua entrada na cidade, deixando entrever, também, um pouco o caráter do filho.

Os assassinos, Pedro e Pablo Vicario, segundo a opinião gera Tinham má catadura, mas eram de boa índole. Pedro e Pablo são os filhos típicos de uma sociedade onde os rapazes são criados para serem homens e as filhas educadas para casar e serem submissas.

Angela, a mais nova e bela das quatro irmãs de Pedro e Pablo Vicario, é uma personagem modelada. 

Inicialmente tida como bela e estúpida, até pelo próprio Santiago, a sua personalidade vai se afirmando à medida que amadurece, rebelando-se contra o comportamento ditatorial e repressor da mãe que a obriga a vestir de vermelho logo após a morte de Santiago Nasar para que não pensassem que estaria de luto pelo amante morto. 

Angela luta persistentemente pela sua paixão pelo marido, apesar da violência com que foi por ele tratada tecendo, ao longo dos anos, uma teia urdida com base na paciência, esperança e fé na ação do tempo, na erosão e sublimação do rancor de Bayardo. Angela é inspirada no arquétipo de Penélope, retirada da Odisseia de Homero e plantada diretamente na obra de García Márquez.

Victoria Guzmán, a cozinheira dos Nasar, vê na intenção dos irmãos Vicario a oportunidade de vingar os rancores acumulados do passado e eliminar a ameaça à possibilidade da filha fazer um bom casamento, evitando-lhe um destino semelhante ao de Angela Vicario. Victoria poderia ter prevenido Santiago e não o fez porque queria, na realidade que o matassem.

Na verdade, todas as personagens poderiam ter, efetivamente, feito alguma coisa para evitar a morte de Santiago, mas a maior parte tinha coisas mais importantes para fazer ou estavam, simplesmente, decididas a minimizar a capacidade dos irmãos Vicario em executar a vingança. Exceto Clotilde Armenta, que tenta avisar Victoria.

Há várias personagens na estória que fazem parte da própria vida do autor/narrador ou que são aparentadas com algumas personagens de Cem Anos de Solidão

Para além das que já foram referidas, aquelas que estão relacionadas com o autor, que na estória aparece como amigo de Santiago são a irmã – Margot –, a esposa – Mercedes – e a tia Wenefrida Márquez, todas elas personagens periféricas, incluídas para dar maior veracidade à estória.

Relacionadas com Cem anos de Solidão está, por exemplo, Dionísia Iguarán, parente de Úrsula que, no romance supracitado, é identificada com a avó do autor, Tranquilina.

Em Crônica de uma morte anunciada surgem, mais uma vez, as mulheres movimentando o destino da personagem principal. Sobretudo Clotilde e Victoria, uma como aliada e a outra como adversária.

Enredo

Angela Vicario casa com Bayardo San Román, um forasteiro que exibe arrogantemente o seu poder econômico, e é devolvida logo após a noite de núpcias, depois de o noivo constatar que Angela já não é virgem.

Pressionada pela família, a jovem denuncia Santiago Nasar como sendo o autor da façanha, julgando que a sua fortuna fará dele um intocável, numa terra onde segundo o costume, as dívidas de honra se pagam com a morte.

Angela engana-se. Pressionada pela mentalidade dominante, típica de uma sociedade patriarcal, a família Vicario é incapaz de aguentar o escárnio motivado pela honra manchada e sente-se compelida a matar o "infame", apesar da pouca vontade em fazê-lo.

Na realidade, os irmãos de Angela fazem tudo para dar a entender as suas intenções com o objetivo de que alguém os impeça e proporcione a Nasar a oportunidade para escapar a uma morte mais do que anunciada.

Apesar de todos os indícios serem facultados no sentido de evitar a morte de Santiago Nasar, o acesso à informação é bloqueado por uma série de imprevistos, contratempos e caprichos do destino.

A morte de Santiago, apesar de apregoadíssima, não é levada a sério pela maior parte das pessoas envolvidas que poderiam tê-la evitado.


Fonte: https://www.passeiweb.com/estudos/livros/cronica_de_uma_morte_anunciada
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sexta-feira, 27 de julho de 2018

Um Apólogo

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Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:

— Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma cousa neste mundo?

— Deixe-me, senhora.

— Que a deixe? Que a deixe, por quê? Porque lhe digo que está com um ar insuportável? Repito que sim, e falarei sempre que me der na cabeça.

— Que cabeça, senhora? A senhora não é alfinete, é agulha. Agulha não tem cabeça. Que lhe importa o meu ar? Cada qual tem o ar que Deus lhe deu. Importe-se com a sua vida e deixe a dos outros.

— Mas você é orgulhosa.

— Decerto que sou.

— Mas por quê?

— É boa! Porque coso. Então os vestidos e enfeites de nossa ama, quem é que os cose, senão eu?

— Você? Esta agora é melhor. Você é que os cose? Você ignora que quem os cose sou eu e muito eu?

— Você fura o pano, nada mais; eu é que coso, prendo um pedaço ao outro, dou feição aos babados...

— Sim, mas que vale isso? Eu é que furo o pano, vou adiante, puxando por você, que vem atrás obedecendo ao que eu faço e mando...

— Também os batedores vão adiante do imperador.

— Você é imperador?

— Não digo isso. Mas a verdade é que você faz um papel subalterno, indo adiante; vai só mostrando o caminho, vai fazendo o trabalho obscuro e ínfimo. Eu é que prendo, ligo, ajunto...

Estavam nisto, quando a costureira chegou à casa da baronesa. Não sei se disse que isto se passava em casa de uma baronesa, que tinha a modista ao pé de si, para não andar atrás dela. Chegou a costureira, pegou do pano, pegou da agulha, pegou da linha, enfiou a linha na agulha, e entrou a coser. Uma e outra iam andando orgulhosas, pelo pano adiante, que era a melhor das sedas, entre os dedos da costureira, ágeis como os galgos de Diana — para dar a isto uma cor poética. E dizia a agulha:

— Então, senhora linha, ainda teima no que dizia há pouco? Não repara que esta distinta costureira só se importa comigo; eu é que vou aqui entre os dedos dela, unidinha a eles, furando abaixo e acima...

A linha não respondia; ia andando. Buraco aberto pela agulha era logo enchido por ela, silenciosa e ativa, como quem sabe o que faz, e não está para ouvir palavras loucas. A agulha, vendo que ela não lhe dava resposta, calou-se também, e foi andando. E era tudo silêncio na saleta de costura; não se ouvia mais que o plic-plic-plic-plic da agulha no pano. Caindo o sol, a costureira dobrou a costura, para o dia seguinte. Continuou ainda nessa e no outro, até que no quarto acabou a obra, e ficou esperando o baile.

Veio a noite do baile, e a baronesa vestiu-se. A costureira, que a ajudou a vestir-se, levava a agulha espetada no corpinho, para dar algum ponto necessário. E enquanto compunha o vestido da bela dama, e puxava de um lado ou outro, arregaçava daqui ou dali, alisando, abotoando, acolchetando, a linha para mofar da agulha, perguntou-lhe:

— Ora, agora, diga-me, quem é que vai ao baile, no corpo da baronesa, fazendo parte do vestido e da elegância? Quem é que vai dançar com ministros e diplomatas, enquanto você volta para a caixinha da costureira, antes de ir para o balaio das mucamas? Vamos, diga lá.

Parece que a agulha não disse nada; mas um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha: 

— Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico. 

Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanando a cabeça:

— Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária!




Machado de Assis - Extraído do livro "Para Gostar de Ler - Volume 9 - Contos", Editora Ática - São Paulo, 1984, pág. 59.
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