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segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Crônica de uma morte anunciada - Resumo

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O livro Crônica de uma morte anunciada, escrito por Gabriel García Márquez, publicado em 1981, conta, na forma de uma reconstrução jornalística, o último dia de vida de Santiago Nasar, num quebra-cabeças envolvente cujas peças vão se encaixando pouco a pouco através da superposição das versões de testemunhas que estiveram próximas ao protagonista. 

É a história do assassinato de Santiago Nasar pelos dois irmãos Vicario, sem chance de defesa. No romance, quase todos os habitantes do lugarejo onde vive Santiago, ficam sabendo do homicídio premeditado algumas horas antes (daí o título), mas não fazem nada de concreto para proteger a vítima ou impedir os algozes.

O objetivo da obra é o de criticar a mentalidade primitiva que permite que um assassínio premeditado tenha uma pena irrisória – independentemente da sua execução ter ou não sido pressionada pelo costume – e que uma jovem seja violentamente penalizada por não ter o comportamento sexual esperado para a época.

Por outro lado, a intenção é também a de demonstrar a consternação face à incrível quantidade de coincidências funestas acumuladas que deixam no ar a inquietante reflexão de que "a fatalidade torna-nos invisíveis".

O livro também trata do perdão e do tempo, da brevidade da vida e da eternidade dos sentimentos.

García Márquez em Crônica de uma morte anunciada, apesar de relatar os fatos de forma objetiva e sem grandes divagações, não deixa de recorrer aos sonhos premonitórios e aos presságios, como que para reforçar o caráter intuitivo quer do narrador/autor, quer das restantes personagens. O ambiente é mostrado como potenciador das emoções, sugerindo determinados estados de alma que, associados a uma capacidade de observação e de ligação de detalhes muito superior à média, se manifesta numa capacidade, também muito superior, de entendimento que muitos tendem a classificar como algo de sobrenatural ou mediúnico.

É deste modo que o autor descreve o dia da morte de Santiago como um dia em que fazia um tempo fúnebre e que no preciso instante da desgraça caía uma chuva miúda como a que Santiago Nasar vira no bosque, no sonho – chuva que era, na realidade, excremento de pássaro (segundo o autor, sonhar com pássaros é sinal aziago). Também a irmã do narrador – Margot – afirma que sentiu passar um anjo quando Santiago falou acerca do seu próprio casamento, fato que não se chegou a realizar.

Outro sinal de presença do incrível é a forma que García Márquez dá ao remorso como punição para o crime e a negligência. O cheiro de Santiago moribundo impregna-se de tal forma nas narinas daqueles que, de alguma forma tiveram o mais leve resquício de culpa, direta ou indireta, na sua morte atacando-lhes as consciências como o mais cruel dos fantasmas. O aguilhão do remorso cai, sobretudo, nos dois assassinos durante o relativamente curto espaço de tempo que passam na cadeia pagando pelo crime, perdendo, inclusive, a faculdade de controlar o próprio corpo, mas sempre sem perder a lucidez.

Apesar de tudo, é Bayardo quem, para a maioria da população, é visto como a maior vítima.

Para recontruir a estória da morte de Santiago Nasar, García Márquez recorreu não só à memória mas também a entrevista das pessoas envolvidas – aqueles que estavam, na altura, mais próximos não apenas da vítima mas também dos assassinos, tentando compor o puzzlle constituído pelos estilhaços da memória.

A partir da morte de Santiago Nasar, são desvendadas as perspectivas e as histórias de algumas pessoas que de uma forma ou de outra, estiveram ligadas à sua morte. Pois, como já citado, a morte de Santiago, foi anunciada por toda a vila de Riohacha, apenas ele, permaneceu na ignorância até ao momento em que foi esfaqueado à porta de casa.

Gabriel García Márquez retrocede e avança no tempo, fazendo do narrador participante o cronista da tal morte anunciada. Desde o talhante à empregada do café. Do padre ao delegado da polícia, todos sabiam muito antes de morrer, que Santiago tinha Pedro e Pablo à sua espera, com as facas afiadas dos porcos. No entanto, por medo, receio, covardia, comodismo, ou mero sadismo, ninguém avisou Santiago, preferindo antes observá-lo, inocente, ingênuo, caminhando impávido e sereno para a morte.

Personagens principais

Santiago Nasar, o protagonista, é filho de um rico emigrante árabe. Sedutor, culto, adepto da caça de altanaria, é apreciador de cavalos, armas e, claro, aves de presa. Já na aparência, Nasar assume o aspecto físico muito semelhante ao do autor – vestia um fato de linho lavado só com água por não suportar o estalar da goma em contacto com a pele, cabelos crespos e pálpebras árabes. 

Mas o que mais impressiona nesta personagem é a sua extrema solidão, característica comum a todos os heróis da ficção de García Márquez, tal como o próprio autor se encarrega de frisar em O Aroma da Goiaba

Nasar, apesar de sociável - tem amigos e um considerável número de pessoas que o estimam -, pauta a sua conduta por uma quase que excessiva reserva, uma independência de movimentos, constituída por um conjunto de atividades solitárias que levam a que as pessoas o deixem cultivar o prazer da sua solidão, da sua redoma, onde só cabe aquilo que comporta a sua imaginação. E é precisamente esta característica que o torna vulnerável e que faz com que passe ao lado de todas as tentativas levadas a cabo pelos outros para impedirem a sua morte: o seu alheamento, por um lado, e a indiferença dos menos íntimos a quem os mais chegados delegaram alguma tarefa no sentido de lhe fazerem chegar a informação.

Já Bayardo San Román, o anti-herói, é uma personagem que, desde o início, desperta a desconfiança de todos. Forasteiro e com um passado nebuloso envolto em mistério, provoca a curiosidade da população local e suscita a proliferação dos mais extravagantes boatos. 

Tem um aspecto algo efeminado, devido às roupas que usa – sempre muito justas e num tom amarelado. Os olhos são dourados – cor que García Márquez associa à vulgaridade e à corrupção por estar diretamente identificada com o ouro, ou seja, com o desejo de ostentação por um lado e com a avareza pelo outro. O seu comportamento extravagante na forma como exibe o poder de compra conquista a família de Angela – família que vê nele uma porta de saída de uma vida pautada pela penúria.

Curiosamente, Bayardo é o filho de Petronio San Román, o general conservador que derrotou o coronel Aureliano Buendía e disparou pelas costas contra Gerineldo Márquez em Cem Anos de Solidão – o que lhe granjeia forte impopularidade aquando da sua entrada na cidade, deixando entrever, também, um pouco o caráter do filho.

Os assassinos, Pedro e Pablo Vicario, segundo a opinião gera Tinham má catadura, mas eram de boa índole. Pedro e Pablo são os filhos típicos de uma sociedade onde os rapazes são criados para serem homens e as filhas educadas para casar e serem submissas.

Angela, a mais nova e bela das quatro irmãs de Pedro e Pablo Vicario, é uma personagem modelada. 

Inicialmente tida como bela e estúpida, até pelo próprio Santiago, a sua personalidade vai se afirmando à medida que amadurece, rebelando-se contra o comportamento ditatorial e repressor da mãe que a obriga a vestir de vermelho logo após a morte de Santiago Nasar para que não pensassem que estaria de luto pelo amante morto. 

Angela luta persistentemente pela sua paixão pelo marido, apesar da violência com que foi por ele tratada tecendo, ao longo dos anos, uma teia urdida com base na paciência, esperança e fé na ação do tempo, na erosão e sublimação do rancor de Bayardo. Angela é inspirada no arquétipo de Penélope, retirada da Odisseia de Homero e plantada diretamente na obra de García Márquez.

Victoria Guzmán, a cozinheira dos Nasar, vê na intenção dos irmãos Vicario a oportunidade de vingar os rancores acumulados do passado e eliminar a ameaça à possibilidade da filha fazer um bom casamento, evitando-lhe um destino semelhante ao de Angela Vicario. Victoria poderia ter prevenido Santiago e não o fez porque queria, na realidade que o matassem.

Na verdade, todas as personagens poderiam ter, efetivamente, feito alguma coisa para evitar a morte de Santiago, mas a maior parte tinha coisas mais importantes para fazer ou estavam, simplesmente, decididas a minimizar a capacidade dos irmãos Vicario em executar a vingança. Exceto Clotilde Armenta, que tenta avisar Victoria.

Há várias personagens na estória que fazem parte da própria vida do autor/narrador ou que são aparentadas com algumas personagens de Cem Anos de Solidão

Para além das que já foram referidas, aquelas que estão relacionadas com o autor, que na estória aparece como amigo de Santiago são a irmã – Margot –, a esposa – Mercedes – e a tia Wenefrida Márquez, todas elas personagens periféricas, incluídas para dar maior veracidade à estória.

Relacionadas com Cem anos de Solidão está, por exemplo, Dionísia Iguarán, parente de Úrsula que, no romance supracitado, é identificada com a avó do autor, Tranquilina.

Em Crônica de uma morte anunciada surgem, mais uma vez, as mulheres movimentando o destino da personagem principal. Sobretudo Clotilde e Victoria, uma como aliada e a outra como adversária.

Enredo

Angela Vicario casa com Bayardo San Román, um forasteiro que exibe arrogantemente o seu poder econômico, e é devolvida logo após a noite de núpcias, depois de o noivo constatar que Angela já não é virgem.

Pressionada pela família, a jovem denuncia Santiago Nasar como sendo o autor da façanha, julgando que a sua fortuna fará dele um intocável, numa terra onde segundo o costume, as dívidas de honra se pagam com a morte.

Angela engana-se. Pressionada pela mentalidade dominante, típica de uma sociedade patriarcal, a família Vicario é incapaz de aguentar o escárnio motivado pela honra manchada e sente-se compelida a matar o "infame", apesar da pouca vontade em fazê-lo.

Na realidade, os irmãos de Angela fazem tudo para dar a entender as suas intenções com o objetivo de que alguém os impeça e proporcione a Nasar a oportunidade para escapar a uma morte mais do que anunciada.

Apesar de todos os indícios serem facultados no sentido de evitar a morte de Santiago Nasar, o acesso à informação é bloqueado por uma série de imprevistos, contratempos e caprichos do destino.

A morte de Santiago, apesar de apregoadíssima, não é levada a sério pela maior parte das pessoas envolvidas que poderiam tê-la evitado.


Fonte: https://www.passeiweb.com/estudos/livros/cronica_de_uma_morte_anunciada
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domingo, 11 de maio de 2014

Machado: ‘Reescrevam-me à vontade, mas…’

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A imortalidade das letras é para poucos, escrevi certa vez com a pena prematura dos vivos, mergulhada naquela tinta mista de arrogância e candura a que chamamos sangue. Corrijo-me, leitor. As nuvens que nos servem de leito lembram alojamentos militares, o pé do insigne tribuno baiano no nariz do dramaturgo francês, o ironista irlandês a roncar junto da orelha peluda do romancista russo. É natural que tal aperto desande por vezes em altercações ríspidas e babélicas, afugentando o sono.

Paciência. As condições insatisfatórias de nossa instalação no Olimpo não devem preocupar os vivos, e já constituímos uma comissão para redigir em três mil vias, todas adornadas com excelentes carimbos, um requerimento aos andares superiores da administração celeste. A menção ao relativo desconforto em que padecemos a eternidade tem o fito único de ilustrar a cena da chegada do boato.

Boatos, ninguém ignora, são leves, rápidos, pouco menos que invisíveis, e guardam o condão de medrar no aconchego dos ambientes atarefados. Este me foi trazido por Alencar, um ponto de exclamação a lhe vincar a bela testa, e dava conta de um projeto grandioso ao qual se dedicam os lentes de nosso país: reescrever-nos de cabo a rabo.

Tentei meter o caso à bulha; disse ao colega que há termos delicados num século e grosseiros no século seguinte; não logrei sossegar seu espírito, que é tudo o que resta dele, e resignei-me a ouvir os pormenores de sua aflição: as verbas públicas de vulto a adubar a empreitada, os 600 mil exemplares vertiginosos com os quais pretendem soterrar meus cinquenta, vinte, dez, talvez cinco leitores…

Passei dias embatucado. O diabinho da vaidade enfiava-me rancor num ouvido, o anjo do desprendimento metia benevolência no outro, e nesse embate acabei com enxaqueca. Ventilei o tópico em palestras vadias, nossa atividade principal cá em cima, com amigos e conhecidos de chapéu. Soube que Defoe, Dumas, Stendhal, Melville e Twain são leitores contentes das versões ditas simplificadas de suas obras; chegam a reputá-las a suprema homenagem a qualquer escritor, por demonstrarem que as criações podem ser privadas das mesmas palavras que lhes dão corpo metafórico – como de um corpo literal nos privou a morte –, e ainda pulsar.

Desse ponto de vista arejado não compartilham todos, é certo. Flaubert bufou prodigiosamente por quinze minutos, com gálica perfeição; Nabokov cacarejou um riso escarninho; Dostoievski, aquele doudo, perorou o assassínio de todas as velhinhas que se meterem com seu vocabulário e sintaxe. Deixei os ilustres romancistas às voltas com seus demônios e me abanquei numa beira de cúmulo para meditar.

Um dos defeitos mais gerais entre nós, brasileiros, é achar sério o que é ridículo, e ridículo o que é sério. Sabia-o antes de ser um autor defunto, e mais o sei agora. A nata de nossa crítica literária levou 67 anos para começar a compreender o que penso de Bentinho, e querem que ginasianos de joelhos ralados e álbum da Copa debaixo do braço decifrem tudo antes do bigode: se conto isso a Molière, inspiro-lhe uma comédia em dois atos. Mas vamos à conclusão a que cheguei.

Reescrevam-me à vontade, caros compatriotas; cancelem palavras raras e chistes eruditos; amputem postilhões de Éolo, hidras de Lerna e asas de Ícaro; aplainem sem piedade as ordens inversas, as ousadias sintáticas, todas as cousas grandes ou miúdas. Depois de certa adaptação de Dom Casmurro para aquilo a que chamam TV, e que aqui captamos na parabólica, creio poder afirmar que já nada me fará mossa. Se de resto me agastar algum aspecto dessa faina, pago-lhes com um piparote, e adeus.

Entretanto, será demasiado pedir-lhes que não sejam mais ingênuos que o habitual? Fazer uma versão “simplificada” de meus livros vai muito além de atualizar o vocabulário: há que cortar fundo na carne, na proporção exata, nem mais nem menos, do sólido analfabetismo funcional cultivado com tanto esmero no corpo do povo. Ocorre que o mesmo pensamento nu, cristalino embora, é hermético para quem não aprendeu a pensar. Em caso extremo pode ser de bom alvitre suprimir a obra de todo, deixando o nome do autor na capa e um maço de folhas virgens de entremeio. Teria sua graça.

Mas devo adverti-los de que Alencar não se encontra em disposição tão benigna. Ficou ontem até noite alta bebendo com Dostoievski; hoje de manhã dei com ele a conspirar com uns índios. Cabe lembrar que a prudência é a primeira das virtudes em tempos convulsos.
 
 
(Sérgio Rodrigues - Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/todoprosa/vida-literaria/machado-reescrevam-me-a-vontade-mas/)
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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

O triste fim de Policarpo Quaresma - Resumo

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Major Policarpo Quaresma era como era conhecido. Vivia no Rio de Janeiro e sua irmã morava junto com ele. Tratava-se de um homem extremamente patriota, fiel e adorador de do Brasil. Na vizinhança achavam graça dele, de como pontualmente chegava em casa sempre à mesma hora e como ficava horas em meio a livros estudando sem ser formado em faculdade alguma.

A última história que comentavam era a visita que ele recebia de Ricardo Coração dos Outros. Tratava-se de um músico, apaixonado pelo violão e que vinha ensinar a Quaresma a arte de tocar tal instrumento.

Tinha dentre as relações de sua casa o General, seu vizinho. Este tinha uma filha noiva que esperava ansiosamente pelo seu casamento, bastando apenas que o noivo concluísse sua faculdade de Odontologia. Tinha ainda um rico italiano e sua filha, de quem era padrinho.

Quaresma, nacionalista como era, estudando os nativos do país, acreditou que o mais certo fosse que todos na pátria falassem tupi. Assim aprendeu a língua e levou às autoridades o seu ideal! Como era de se esperar, tornou-se motivo de riso e escárnio. Mas o máximo de tudo foi quando irritado, sem sequer notar, escreveu um dos documentos públicos todo na língua dos nativos.

Depois disso restou a Quaresma ser levado ao hospício! Lá ficou por um bom período, e recebia visitas de sua afilhada e seu pai e de Coração dos Outros; sua irmã não ia muito bem para lhe fazer visitas.

Ao final de sua “estadia” no hospício, tomou um conselho que lhe foi dado. Comprou um pedaço de terra e foi viver de agricultura no interior. Seu forte sentimento nacionalista o enchia de esperanças, como a terra fértil do Brasil lhe seria bastante para viver e como uma reforma na agricultura do país poderia ocorrer...

Os projetos eram muitos, mas Quaresma teve que ver a verdade. Lucros pequenos, as demais terras todas mal tratadas e as malditas formigas.

Neste tempo, sua afilhada se casara com um egocêntrico médico e a filha do coronel, seu vizinho, sofria com o noivo, que fora para o interior e nunca mais mandara notícias.

Foi então que uma rebelião nasceu. Quaresma prontamente se ofereceu a serviço da pátria e foi feito de fato major. Coração dos Outros também teve que lutar a serviço do país, no entanto fora quase que obrigado.

Por um longo tempo Quaresma ficou sem ver sua irmã, esta ficara nas terras dele no interior que, sem sua supervisão e amor, já se tornava como as demais terras abandonadas – o ajudante que tinha não sabia levar o trabalho de forma que rendesse.

Ao decorrer da rebelião, a filha do coronel, sempre presa na idéia do casamento e de ter sido abandonada, abalou-se profundamente e o desespero levou-a à loucura e posteriormente à morte. Nesse tempo Quaresma pôde ver como se iludira com o Brasil e acima de tudo com os seus governantes.

Seu último ato, já findada a rebelião, foi escrever uma carta às autoridades do país, onde declarou tudo o que pensava a respeito do Brasil, suas vantagens, suas chances de glória e seu governo que o afundava. A conseqüência foi ser levado preso, sem chances de defesa. Ricardo Coração dos Outros procurou ajuda, mas todos só afirmavam que o louco do Quaresma não tinha chances, e ainda a afilhada tentou salvá-lo. Por fim, concluíram que era mais digno ao Major Policarpo Quaresma aquele fim.



(Marla Rodrigues - http://vestibular.brasilescola.com/resumos-de-livros/o-triste-fim-policarpo-quaresma.htm)

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sábado, 26 de maio de 2012

A Literatura e a Vida

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Por que ler os clássicos? O que há neles de fundamental para nós? Com essa questão em mente, reli Hamlet, anotando os seus ensinamentos.

Antes de dizer adeus a Ofélia, Hamlet envia a ela um poema: "Duvida de que os astros sejam chamas / Duvida de que o sol gira / Duvida da própria verdade / Mas não duvida de que eu te amo". Algumas poucas linhas para dizer o essencial sobre o amor. Ou seja, que ele não suporta a dúvida, a desconfiança. Como é patente, aliás, na história de Eros e Psiquê, que vale rememorar.

Sendo o mais terno dos amantes, Eros não deseja ser visto e só vai ao encontro de Psiquê à noite. Desconfiada de que Eros seja um monstro, Psiquê se vale do sono dele para iluminar o seu rosto. Surpreendida pela beleza que se revela, deixa cair da lamparina uma gota de óleo quente no ombro do amante, que acorda assustado e vai embora enfurecido.

Também sobre a vida e a morte Shakespeare diz o essencial em poucas linhas. Assim é no diálogo de Hamlet com a rainha, sua mãe. Para fazê-lo aceitar a morte do pai assassinado, a rainha diz: 

"... tudo o que vive deve morrer, ser levado pela natureza para a eternidade". 

Palavras sábias. Tanto quanto serão as do novo marido da rainha, o assassino, o rei usurpador, que, temendo a vingança de Hamlet, procura apaziguá-lo com as seguintes palavras: 

"Viver a tristeza do luto, durante algum tempo, é uma obrigação filial, mas perseverar numa aflição obstinada é indício de teimosia... de um coração sem humildade, de uma alma sem resignação, de um julgamento fraco e malformado".

A leitura dos clássicos se faz necessária pela sabedoria que eles contêm. Em especial, a sabedoria que se refere aos sentimentos humanos. Ela nos faz refletir e viver melhor. Hamletensina a não fazer pouco do amor e a não desperdiçar a vida, chorando infindavelmente a morte e a perda.


(Betty Milan - Fonte: Veja - edição 2247)
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quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O Sítio politicamente incorreto - ou - Quem pode assegurar que Tia Anastácia não fosse quilombola?

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O SÍTIO POLITICAMENTE INCORRETO


O poderoso Conselho Nacional de Educação (CNE) decidiu emitir uma notificação de censura ao livro Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato, que seria distribuído à rede de ensino do país. A conselheira Nilma Lino Gomes leu a obra e viu nela preconceitos contra a África e racismo. Exigem, então, os conselheiros, que o texto venha precedido de uma reprovação de seus desalinhos ideológicos com a nova realidade nacional. Tenho certeza de que não faltará quem se habilite a produzir esse importante prefácio corretivo. Seja qual for a estupidez, sempre há quem se considere capaz.

Dei uma investigada no Sítio do Pica Pau Amarelo, uma lida no livro e venho em socorro do Conselho: Caçadas de Pedrinho é politicamente incorreto de capa a capa! O sítio inteiro, aliás, está a exigir cuidadosa inspeção do Ministério Público Federal. Em primeiro lugar porque, há muito tempo, era para estar desapropriado (atenção, Incra!). Que negócio é esse? Uma propriedade rural com utilidade apenas ... literária? Péssimo exemplo para estar sendo apresentado à uma juventude que se quer cidadã e comprometida com as causas sociais.

Tem mais, conselheira Nilma. Cadê a certidão de propriedade do sítio? Alguém já a viu? E não me venha o branquela do "seu" Monteiro Lobato com uma simples trintenária julgando que seja suficiente. Não no Brasil moderno! Quem pode assegurar que Tia Anastácia não fosse quilombola? Detentora dos direitos culturais históricos protegidos pelos artigos 215 e 216 da Constituição Federal? Ou dos muito prováveis direitos de posse mencionados no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Hum? É admissível que uma republicação de Caçadas de Pedrinho, em tempos de Lula e Dilma, deixe de mencionar tais avanços da sociedade brasileira?

Na pesquisa que fiz, encontrei uma foto da negra Anastácia, datada de 1913 (está disponível na Wikipedia). Era magra, de meia idade. Na imagem, aparece tendo ao colo o menino Guilherme, filho de Monteiro Lobato. O autor, reiteradas vezes, admitiu publicamente, que essa Anastácia, essa pobre e infeliz Anastácia, havia inspirado a criação da personagem Tia Anastácia! Basta fazer as contas para perceber que a desventurada senhora foi, ela mesma, escrava. Fugida ou liberta, não importa. E acabou, mais uma vez, sendo explorada pelo patrão branco que promoveu o uso gratuito de seus evidentes direitos de imagem. Pode o Conselho Nacional de Educação silenciar sobre tal iniquidade? Referendar obra que escarnece valores tão significativos? Anota essa outra aí, conselheira Nilma.

Quer mais, o CNE? Debruce-se sobre o personagem Visconde de Sabugosa. Pondere, leitor. O visconde é um personagem da nobreza. Encarna saber e coragem física. Tantas vezes morresse, tantas vezes era ressuscitado com a simples troca do sabugo que compunha seu corpo. É ou não uma exaltação simbólica da elite nacional e de sua perpetuação através dos tempos? Pode haver algo mais antidemocrático e elitista do que um imortal representante da nobreza, além de tudo apresentado como encarnação da sabedoria e do destemor? Eu, hein! E para finalizar: cadê a autorização do Ibama para a Caçada do Pedrinho?



(Percival Puggina - http://www.puggina.org/)

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Em defesa de Monteiro Lobato, da literatura brasileira e das nossas crianças

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Abaixo-Assinado Em Defesa de Monteiro Lobato

Destinatário: Ministro da Educação Fernando Haddad

 

Assine este Abaixo-assinado:



Senhor Ministro da Educação Fernando Haddad,

Dispensando formalidades desnecessárias vou direto ao ponto. A Folha de São Paulo publicou em 28/10 uma matéria onde o CNE – Conselho Nacional de Educação – encaminha um parecer para depois de analisado ser homologado ou não, de sua parte. Tal parecer sugere a retirada do livro “Caçadas de Pedrinho” de autoria de Monteiro Lobato da lista de distribuição de livros em escolas públicas para o ano letivo de 2011, justificando ser a obra racista.

Pois bem. Cumpre agora adentrar no cerne da questão em primeiro momento sob a ótica literária e histórica e em segundo momento sob o aspecto jurídico do ato futuro a ser encetado. Certamente este parecer realizado pela Senhora Nilma Lino Gomes, professora da UFMG carece de conteúdo capaz de fundamentar quaisquer atos alheios futuros, serve apenas para induzir em erro pessoas de boa crença e intenção, haja vista o total desconhecimento sobre a grandiosidade da obra de Monteiro Lobato.

Lobato produziu durante toda sua carreira literária 26 títulos destinados ao público infantil, seara a qual se destaca contemporaneamente em liberdade criativa e imaginativa.


Lobato numa época em que as crianças deste país ainda eram tratadas com severidade resgatou e estimulou o onírico infantil com seus escritos, do contrário para que seria editado o Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990 muitas décadas mais tarde então?


Lobato visionariamente trouxe lirismo a uma realidade crua, perversa e chocante a muitos brasileiros em idade escolar, como ainda hoje diante de tanto desamor e descaso são arremessados pela vida tendo somente a instituição pública como educadora.

Lobato se doou literariamente por compaixão aos pequeninos e por paixão à literatura brasileira.

Lobato ao escrever na obra ameaçada de exclusão “Caçadas de Pedrinho”: “Tia Nastácia, esquecida dos seus numerosos reumatismos, trepou, que nem uma macaca de carvão". (...) "Não é à toa que os macacos se parecem tanto com os homens. Só dizem bobagens", não faz apologia alguma ao racismo, apresenta um Brasil mais livre de preconceitos e isento de compreensões deformadas e tendenciosas, compreensões estas contemporâneas capazes exclusivamente de promover e fomentar sentimentos de inferioridade. Ele vê as pessoas como iguais, igualdade tão defendida e assegurada em nossa Constituição Cidadã promulgada em 1988 sob a égide de uma Constituinte legítima.

Lobato trabalha com graciosidade seus personagens apresentando ricos desdobramentos, do contrario por quais motivos pessoas se ocupariam em transformar “O Sítio do Pica Pau Amarelo” num seriado de infinitos episódios?

Quem de nós não se recorda das aventuras da Narizinho, das comidas deliciosas da Tia Nastácia ela que cozinhou até para São Jorge na lua, da risada feliz do Tio Barnabé, da sapiência do Visconde de Sabugosa que quase morreu empanturrado de álgebra e ainda assim ensina geografia e geologia, ajudando posteriormente a descobrir petróleo nas terras do sítio. E como ele sabe sobre petróleo... Da teimosia e tagarelice da boneca gente a Emília, das histórias embaladas pela cadeira de balanço da Vovó Benta, ou Dona Benta Encerrabodes de Oliveira, uma grande mestra na geografia, do besouro Mestre Cascudo entendido sobre as questões da terra e já naquela época um bravo defensor ambiental, do Lobisomen e seu folclore assim como o Saci Pererê, do peixe o Príncipe Escamado que ficou noivo da Narizinho e levou a turma para conhecer as maravilhas do fundo do mar, do Quindim um rinoceronte craque na gramática, do Rabicó um porquinho animado que virou Marquês, da Cuca que dormia uma noite a cada sete anos e seus mirabolantes feitiços, de Pedrinho e toda sua coragem...


Lobato, ah Lobato! Lobato foi pai, mãe literato, historiador. Lobato ajudou a história brasileira se situar nos anais da cultura mundial. Não somos um povo sem história como muitos dizem isso não é verdade temos uma bela história contada por uma diversidade infinita de institutos.

Eliminar obra de Lobato da lista de distribuição de livros às escolas da rede pública brasileira é o mesmo que riscar, apagar, expurgar, aniquilar a história de um país, e para, além disso, eliminar definitivamente possibilidades de comparações dos próprios avanços entre décadas é desconsiderar nossa própria história e autoritariamente impedir que novas gerações conheçam este universo encantado, rico e tão festejado de Lobato. Uma alegação de racismo como essa é desprovida de embasamento cultural, social, histórico e humanitário. É uma análise superficial descabida e eivada de subjetividades viciadas, e, por conseguinte, impeditivos categóricos de promover um norte, um parecer e olhar extemporâneo, uma opinião substancial e consistente devido à miopia que a assola.

Rechaçar a distribuição dos livros de Lobato nas escolas da rede pública é o mesmo que, por analogia, apagar a existência e o trabalho de Alberto Santos Dumont o pai da Aviação, assim considerando. Ambos em suas genialidades contribuíram e ainda contribuem enormemente com a nossa sociedade, com a nossa cultura, com as nossas raízes.

Sob o segundo momento, o aspecto jurídico ao qual me referi anteriormente apresento-o agora.

A doutrina mais abalizada no âmbito do pós-moderno Direito Administrativo defende a afetação dos atos discricionários de qualquer funcionário público sob a égide do Poder Judiciário. Diversas jurisprudências, ou julgados sob o tema já se formaram pelos muitos tribunais deste enorme país e todas favoráveis a respeito. É um direto de qualquer cidadão adentrar o certame e questionar esta esfera de discricionariedade - inclusive os atos do Presidente da República - capaz de produzir desconformidade com os interesses e necessidades coletivas. O interesse público não se sobrepõe mais como no passado, na contemporaneidade a sociedade avança substancialmente em defesa da democracia e participação cidadã, como agora faço, por exemplo, ao exercer meu direito de manifestação pela defesa de uma das obras de Monteiro Lobato, o qual nos presenteou com um rico Patrimônio Literário Histórico Cultural.


Por último, rogo ao Ministro como cidadã, apreciadora inveterada do imortal Monteiro Lobato e por último como escritora pela permanência da obra “Caçadas de Pedrinho” na lista de distribuição às escolas da rede pública não somente para 2011, mas para que se perpetue por todos os anos futuros se transformando, por assim dizer num dogma. É o mínimo que podemos fazer como um povo civilizado, culto e de consciência.

Ainda, vale lembrar se acaso a notícia veiculada não reproduzir a verdade dos fatos, sugiro ser enviado pelo Ministro, ou pelo departamento jurídico do Ministério um ofício ao Ministério Público Federal, para que dentro das suas atribuições de Custos Legis atue, investigue, processe e puna os responsáveis obrigando-os inclusive a publicar nota de desagravo na mídia sobre o tema.

Cordialmente,

Eliana Schuster