sexta-feira, 6 de março de 2009

Qual a fronteira entre a competição e a dignidade?

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Analisando tudo e todos os seres que compõem este planeta vemos que inegavelmente as leis que regem a natureza se mostram atuantes em todos os aspectos evolucionais, porém ao ser humano há também a atuação de leis que regem sua conduta.

Se para sobreviver os seres irracionais agem motivados exclusivamente pelos instintos, forças além de sua vontade, sem barreiras morais que lhes limitem a competição pelo espaço, alimento ou o que quer que seja, os seres racionais agem utilizando o livre arbítrio, ou seja, a vontade.

Segundo o filósofo Immanuel Kant “a vontade é uma espécie de causalidade dos seres viventes, enquanto dotados de razão”. É a vontade que determina a ação e é a razão que determina a forma com que se vai praticar a ação. Sendo assim o ser racional tem como fronteira entre a necessidade física, objetiva, e sua necessidade emocional, subjetiva, tudo o que aprendeu em termos de leis morais que determinam sua dignidade como ser humano.Observando a natureza vemos que é a competição que determina quem e como sobreviverá. O ser humano estabeleceu desde os primórdios do tempo uma competição intra-específica (entre indivíduos da mesma espécie) e interespecífica (indivíduos de espécies diferentes).

Para lutar pela sobrevivência, os homens das cavernas se reuniram em grupos, assim aumentavam as suas chances de sobrevivência; estabelecia-se aí uma competição tanto com o meio quanto entre eles mesmos, pois era necessário se determinar quem seria o chefe do grupo, quem sairia para caçar, quem era o mais forte etc.

Surgia socialmente a disputa através, principalmente, da reafirmação do ego (centro da consciência inferior) submetido ao Id (reservatório da energia psíquica, onde se “localizam” as pulsões).Refletindo sobre o mito bíblico de Caim e Abel, filhos de Adão e Eva, em que se presencia o primeiro fatricídio ocorrido nas escrituras, podemos concluir que o fato se deu pela competição estabelecida entre eles.

Caim, ao matar Abel, deixou de lado toda uma barreira ética de conduta por se deixar levar pelos sentimentos de vaidade, orgulho e inveja. Toda dignidade devida a disputa entre os dois foi vencida, pois o ego de Caim submetido ao Id tornou-o imoral e destrutivo. O superego (censura das pulsões que a sociedade e a cultura impõem) não foi acionado pelo embotamento de sentimentos nobres e elevados. A vontade que determinou a ação objetivava um fim em si mesmo, a vitória a qualquer preço.

Segundo a definição de Kant, apresentado na 2ª seção da Fundamentação da Metafísica dos Costumes, a dignidade é o valor absoluto da racionalidade humana. O que atribui dignidade à uma pessoa é a sua natureza racional, ou seja, o fato de possuir vontade.

Kant afirma nesta apresentação que a “dignidade é reconhecida como o valor de uma maneira de pensar”. Este valor, segundo o filósofo, coloca-se acima dos valores de mercado ou sentimento por constituir-se um valor absoluto.

O conceito de dignidade possibilita o estabelecimento da relação entre a forma do princípio prático subjetivo (impulso) e a forma do princípio prático objetivo (razão). Os seres humanos querem objetivamente a lei da razão, mas, subjetivamente, as inclinações humanas contrariam a própria autonomia da vontade.

Objetivo é o princípio válido categoricamente para todos os seres racionais. A forma para atingir o objetivo é escolha pessoal. O preço da dignidade é definido intimamente em cada um, pois se o preço das coisas se estabelece no mercado, a dignidade tem valor moral.

A dignidade das pessoas é o que lhes atribui valor absoluto, pois as caracterizam como fim objetivo.

Se cada pessoa é um fim objetivo, então, diz Kant, “nenhuma pessoa pode ser utilizada unicamente como meio”. Isto significa que a dignidade dos seres racionais – enquanto pessoas – põe um limite, em certo sentido, a todo livre arbítrio. Cabe aí a frase que diz que o direito de um termina quando começa o direito do outro.

Utilizar-se de outro para atingir uma vitória pessoal além de amoral é formalizar pouca distinção pela própria capacidade de vencer.

Em nossa sociedade cheia de urgências e demandas de oportunidades o homem se vê diuturnamente envolvido nas mais diversas modalidades de competições, sejam elas esportivas ou não. Reconhecer que os indivíduos estão acima de qualquer preço é reconhecer seu valor íntimo, é estabelecer uma fronteira entre a competição e a dignidade. Introjetando princípios e leis, que do ponto de vista da eternidade invertem a verdade individual, como os ensinamentos do Cristo que diz: ”não faz ao outro o que não queres que te façam” e “ama ao teu próximo como a ti mesmo” exortamos toda a capacidade de transcendência humana que nos capacita eleger uma forma de proceder que nos impede de distanciarmos de valores éticos e morais que nos permitem estabelecer limites para o exercício da vontade individual em benefício da vontade do outro, da família, da coletividade e da própria sociedade humana estabelecendo o limite entre a competição e a dignidade.

(Tuane Vieira é Doutoranda pelo Instituto de Bioquímica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro- UFRJ - Fonte: http://www.nocaso.org)

2 comentários:

  1. Olá, em tudo que se faça tem que ter garra, determinação, força de vontade e caima de tudo, ética, respeito a quem está em disputa, solidariedade e respeito às leis e aos princípios do bom caráter, de pessoa íntrega e de honestidade.

    Segindo esses princípios, certamente qualquer pessoa consegue ter sucesso sem agredir ninguém. A vitória (seja na profissão, no negócio, na política, no esporte, etc.) somente pode ser considerada uma vitória de verdade ser for pautada pelos princípios mencionados acima.


    Abraços


    Francisco Castro

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  2. Acho que a questão é social. Fomos educados para a competição, existem teorias pedagógicas que são contra essa visão. Eu tb sou.

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