domingo, 5 de julho de 2009

Encoxada - Martha Medeiros

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"Todo homem sofre da "síndrome Paulo Maluf" e pensa que tudo na vida dele deve ter cara de grande obra. Comida, por exemplo. Tem coisa mais irritante que homem na cozinha?

Pois os moços passaram séculos longe do fogão e, como não poderia deixar de ser, no momento em que colocaram os pés 44 naquele território,viraram todos, chefs'.

Você dá o maior duro azarando o cara, finalmente, descola um convite e sai de casa, crente que "quer jantar na minha casa?" significa "oba, vai rolar sexo"!

Toca a campainha vestida para matar e sem calcinha sob o modelito vermelho, levando debaixo do braço aquele tinto francês que comprou no supermercado, seguindo seu infalível critério de "rótulo bacaninha que lembra gravura 'art nouveau' do Alphonse Mucha".

Aqui, primeira dica importante: não ouse dizer que o vinho veio do Carrefour, senão você vai ouvir uma longa preleção mais ou menos na linha "eles deixam as garrafas em pé... blablabla... vinho europeu não viaja bem...blablabla... a rolha resseca... blablabla..." (se rolar, não se esqueça de balançar a cabeça concordando com ele, combinado?).

Também nem tente argumentar qualquer coisa, confiando naquele curso de degustação de vinhos que você fez há quatro anos, lembra? Lembra nada! você saía totalmente chumbada de lá todas às vezes...

Pois para sua decepção, quem estará à porta, será uma criatura com ar grave de alquimista prestes a descobrir o segredo de Midas, reclamando da dificuldade de se encontrar uma boa pimenta jamaicana, segurando uma bugiganga Le Creuset de tirar a pele de legumes, embrulhado em um avental imenso, engomado, com monograma bordado,
imaculadamente branco e, para o seu azar, sem aquela abertura atrás - e você, louca pra vê-lo cozinhando um miojo de bum-bum de fora, né? Confessa...

É compreensível, meninas. Os homens estão sofrendo de uma espécie de novo-riquismo culinário.

O gourmet requintado em que ele se transformou ontem, jamais passaria pela humilhação de pilotar um fogão como o seu, cujo máximo de avanço tecnológico é a lâmpada amarelada do forno.

Não, ele torrou 22 mil dólares num Ilve italiano de sete bocas, com grelha, chapa infravermelha para aquecer comida e dois fornos programáveis.

Fazer as poções mágicas em panelinhas com teflon pra lavar mais facilmente?
Seria muita pobreza, para quem comprou uma 'poissonnière' de cobre com interior revestido de estanho, só para fazer peixes no vapor ("uma pechincha, 250 dólares").

Conjuntinho de facas como aquelas que você ganhou de presente da tia-avó no primeiro casamento? Jamais!

No entender dele, nenhuma matéria-prima de manjar dos deuses, merece menos que facas artesanais Zakharov com cabo de osso e madeira.

Duas horas e meia depois, o jantar está servido.

Sabe aquele frango refogado que você faz em vinte minutos, jogando um punhado de temperos a olho?

É mais ou menos isso, só que coberto por uma finíssima fatia de manga, arrematada com umas três ou quatro lascas de gengibre. Isso se não vier acompanhado daquele molho de ervas que não combina com nada, e ele insiste em colocar em tudo. E pensar que você estava rezando pra que aquela manga fosse virar sobremesa, escoltada por uma
bolota de um reles sorvetinho da Kibon...

Conselho de quem não quer que você arruine definitivamente a noite: tem de dizer que ele tá "ali, ó" com Emmanuel Bassoleil.

Não, melhor ainda: foi um prato comparável ao poulet do Paul Bocuse.

Fim do banquete, vá arregaçando as mangas para ajudar a lavar louça.

Se deixar por conta dele, serão mais duas horas esfregando as três panelas de cobre, duas de pedra sabão e o processador de alimentos que sujou 17 peças pra picar salsinha, equipamentos rigorosamente necessários para cozinhar uns 250g de frango.

Hora do café, hora do relax, certo?

Pelo menos agora, você finalmente vai experimentar a tal griffe 'Illycaffè', que custou a ele uma nota preta, sem imaginar que o elogiadíssimo blend tem cerca de dois terços de café brasileiro.

Quando a água ferve, ele grita e de um salto, chega ao coador.

Queimadura?

Não, puro horror, porque "água para café não pode ferver de jeito nenhum".

Ah, que saudades daquele tempo em que cozinhávamos com um "ajudante" tarado, encoxando a gente na pia...

4 comentários:

  1. Sobre a Encoxada e o Cordon Bleu da dona Martha

    Por muito apreciar os vinhos e de me aventurar, ocasionalmente, no que a autora considera um sacro território feminino - a cozinha - , é que que dispus a fazer troça com esta página bem escrita pela consagrada escriba.

    Vulgaridades explícitas e direto ao ponto: a fixação da autora deve ser, apenasmente, trepar.
    Não a conheço e admiro seus textos mas, pelo conteúdo deste "Encoxada", deve estar passando por uma sindrome tardia de hiperestrinismo juvenil, tamanhos os sintomas de prurido nas partes baixas.
    Pontifica sobre coisas que, aparentemente, finge desconhecer, apesar das demonstrações de larga cultura.
    Finge ignorar, por exemplo, que desde que o ato de cozinhar é profissão, mormente na França, a pátria da da comida elevada à condição de arte, só homens tinham sucesso neste mètier.
    Mulheres eram honrosas exceções, mormente restritas ao ofício do lar.
    No presente, mulheres são galardoadas com o tal cordon que dá título à matéria; cozinham profissionalmente em grandes restaurants e não mais pilotam os simples fogões domésticos evocados por ela.
    Se cozinhavam apenas profissionalmente,hoje homens cozinham também como hobby, na medida em que mulheres jogam futebol, praticam boxe, dirigem caminhões e ônibus ou são policiais. Nada mais natural: Simone de Beauvoir e Betty Friedan fizeram escola...

    Entenda, Dona Martha: um convite para jantar é mais que um convite para jantar, não se presta apenas para justificar um fenômeno da fisiologia, i.e., aplacar a fome.
    Deve ser encarado no mínimo como um ato social e no máximo (aí, sim!) como um pré-operatório para que a convidada seja abatida.
    Conhecer um mínimo sobre o vinho que se bebe é dar um ar de civilidade à libação e, en passant, a pimenta jamaicana é o condão que confere nobreza ao ciscante.
    Já o jantar, este deve ser visto como teatro, é o pano de fundo que tornará
    o sexo uma celebração, não a trepada animal, bestial e reprodutiva.
    É uma questão de ritual, não deve ser visto por outra perspectiva.
    O resto das suas ilações é formigamento nas pudendas partes, que dispensam o franguinho travestido de haute cuisine, que validará e enobrecerá o pós operatório na horizontal. E que, eventualmente, pode até ser na vertical mesmo, ainda na cozinha.

    Quer dizer, então, que o negócio é partir direto pro abate, né dona Martha?

    Álvaro
    falcao@ufmg.br

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  2. Ouvi esse Ana Maria Braga falando desse texto ontem no programa dela, fui procurar pra ler melhor e caí aqui! Muito interessante o texto!!

    Mas esse comentário desse Álvaro... que comentário mais babaca cruzes!!
    Desde a interpretação do texto (E daí se uma mulher quer só trepar?) até expressar a opinião chamando de dona para demonstrar pouco caso é a maior babaquice que já vi na vida eu heim!!

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  3. Ouvi esse Ana Maria Braga falando desse texto ontem no programa dela, fui procurar pra ler melhor e caí aqui! Muito interessante o texto!!

    Mas esse comentário desse Álvaro... que comentário mais babaca cruzes!!
    Desde a interpretação do texto (E daí se uma mulher quer só trepar?) até expressar a opinião chamando de dona para demonstrar pouco caso é a maior babaquice que já vi na vida eu heim!!

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  4. Bom, adoro homem na cozinha!!!
    Pilotando o fogão ou atrás de mim........
    E quando cansar: Vamos a um restaurante!!!
    Que chatinha seria a vida sem variação...

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