
No dia 4 de agosto, anunciou-se que os empregos na construção civil dobraram em um ano, o maior contingente de empregos formais desde 1995. A manchete do meu jornal no dia 5 era: “No STF, teles mantêm sigilo de grampos”. Outros destaques do dia na primeira página foram o recuo da bolsa de valores e os ataques terroristas às vésperas dos jogos olímpicos. De novo, nada de empregos.
No dia 5 de agosto, a Fundação Getúlio Vargas divulgou um estudo segundo o qual a classe média no Brasil está crescendo. No mesmo dia, o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) dizia que a pobreza no país está diminuindo. O jornal que assino, no entanto, destacava na manchete do dia seguinte o mapa da violência em São Paulo e, mais uma vez, as escutas da Polícia Federal. A boa notícia até que aparecia na primeira página, mas enigmática: “Estudo vê ganho de renda mais sólida e classe média maior”.
Eu não consigo entender esta opção sob nenhum aspecto. Por exemplo, o da venda de exemplares em banca, que deveria ser primordial para eles, já que vem despencando a cada ano. Será que um assunto como as futricas envolvendo a PF realmente vende mais jornais do que o aumento de empregos? Será que a violência paulistana interessa mais a potenciais leitores do que a ascensão social num país onde a desigualdade é um problema tão grave? Duvido.
Todos os dias acompanho, no mesmo jornal que assino, uma coluna onde se compilam notícias sobre o Brasil mundo afora, e as boas novas se sucedem. Uma hora é o futuro promissor do país em órgãos respeitados como o jornal New York Times ou a revista The Economist. Noutras, o de empresas nacionais como a Petrobras, que, segundo a Newsweek, será a maior empresa do mundo em cinco anos. Por que estas coisas não ecoam por aqui? Na real, a única opinião que vem de fora que vale, para a mídia, é a do presidente francês Charles de Gaulle de que “o Brasil não é um país sério”. Basta surgir algum problema para a lengalenga recomeçar: “ah, bem que De Gaulle blá-blá-blá”.
Frase de 1963... Não sei quanto a vocês, mas eu nem era nascida! Vamos combinar, de lá para cá muita água rolou por baixo da ponte. Obviamente, tem milhões de coisas que precisam melhorar no Brasil, mas daí a achar que essa sentença continua ditando regra é outra história. O mundo mudou, o Brasil mudou, De Gaulle até já morreu. Por que então os articulistas seguem se apegando a este vaticínio imutável até os dias de hoje? Por que o usam para ratificar que nosso destino é o fracasso até o final dos séculos, amém? Não é apenas porque se publicarem boas notícias vão parecer estar a favor do governo.
Não, o negócio é mais amplo. Pensei muito e cheguei à seguinte conclusão: os jornais optaram pela cultura da má notícia, das eternas nuvens negras sobre nossas cabeças, porque a mídia e quem ela representa (os tucanos, sobretudo) simplesmente não acreditam que o Brasil possa melhorar. Duvidam que o Brasil possa vir a ter um destino diferente de “não ser um país sério”. Que um dia cheguemos “lá”. Por isso, apostam na violência, na corrupção, no desemprego e na desgraça em suas manchetes.
Lembrem do Fernando Henrique. Ele nunca acreditou no Brasil. Comportava-se como se fosse “o presidente de primeira de um país de terceira”. E, bom, nem uma nem outra coisa provou ser verdade... O restante de seus colegas emplumados pensa igual em relação a São Paulo, que é uma exceção de primeiro mundo num país furreca. Nenhum deles acha que o Brasil presta. Todos se acham acima do país. É um problema grave para um político, não acreditar numa nação que quer governar.
Lula também é vítima da soberba, também ficou metido a besta ao chegar à Presidência. Mas eu estaria sendo injusta se dissesse que ele não acredita no Brasil. Acredita, sim. Tanto que, mesmo “se sentindo”, estou segura que o ex-operário não se considera acima do país. Sente-se menor do que ele, sabe que o potencial da nação que dirige é grande, maior que o seu próprio. Isto é bom. Mas tem gente no PT que não aposta no país, assim como em todos os partidos, à imagem e semelhança de nossa mídia.
Não é uma questão de ser ufanista, não. Ser ufanista é babaquice. “Este é um país que vai pra frente, uou-uou-uou-uou”, nada disso. Lula às vezes quer transmitir essa idéia, e não é porque vivemos tempos de Olimpíadas que fico tentada a embarcar nela. Para falar a verdade, nem sempre torço pelo Brasil em muita coisa.
Mas quero ter o direito de acreditar que ele pode dar certo. Já visitei vários lugares e sei que o Brasil é especial, um bom lugar para se viver. Um dos melhores países do mundo, de verdade. Dou graças aos céus por ter nascido aqui em vez de, sei lá, no Afeganistão. O Brasil não é um país de terceira, podem acreditar no que digo. Temos estrela, podemos ser protagonistas. Não se deixem levar pelos urubus da mídia a dizer o contrário.
Sei que é considerado o supra-sumo da sofisticação intelectual ser pessimista. Mas deixem-me ser otimista, por favor. Se isso é ser raso, é problema meu. E sabe o que mais? Vai te catar, Charles de Gaulle.
(Cynara Menezes)
Um grande texto,com muita sobriedade,como poucos que vi recentemente,parabéns!!
ResponderExcluirUm forte abraço.