domingo, 11 de dezembro de 2011

Fernando Pimentel, o consultor tubaína: pequenas empresas, grandes negócios

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Quando se escrever “Todos os Homens da Presidenta”, o livro noir sobre a degradante equipe ministerial do governo mais malfeito da história republicana, o capítulo dedicado a Fernando Pimentel talvez seja o mais recheado de espantos, apêndices e rodapés. O prólogo desse capítulo, ainda à espera de um epílogo decente, está sendo divulgado, a conta-gotas: entre sua saída da prefeitura de Belo Horizonte, em 2009, e sua oficialização como um dos homens da confiança da amigona Dilma, em 2010, Pimentel montou uma plataforma intermediária de prospecção de ouro negro, a “empresa de consultoria” P-21 — que faturou cerca de dois milhões de reais nos poucos meses que separam o ex-prefeito e conspícuo papagaio de pirata da candidata na campanha presidencial do futuro o poderoso ministro do “desenvolvimento” do governo mais “desenvolvimentista” dos últimos 510 anos.

Como observou Elio Gaspari, em sua coluna de quarta-feira, não é nada, não é nada, dois milhões de reais é quatro vezes o que o general da Força Aérea Americana Brent Scowcroft, ex-assessor militar dos presidentes Bush pai e Gerald Ford, ganhava por ano do escritório de ninguém menos que Henry Kissinger como chefe de sua consultoria para assuntos de segurança nacional. Uma análise de Brent sobre negócios americanos em áreas de conflito pode valer bilhões de dólares. Quanto vale um palpite infeliz de Fernando Pimentel sobre o que quer que seja? Como formalizava sua consultoria? Por telefone? Pasta de plástico? Em planilha Excel? E-mail?

Não importa. A Federação e o Centro de Indústrias de Minas Gerais achou uma pechincha pagar R$ 1 milhão por nove meses de consultoria do ex-prefeito e futuro ministro ─ embora pudesse ter comprado os dados fornecidos por Pimentel por R$ 2,50 ao dia, o preço de um exemplar de O Estado de Minas.

Até aí, tudo bem: é preciso ganhar a vida. Alguns PIGs mal intencionados insinuam que consultoria de ex-ministro ou de alguém em vias de sê-lo é um nome chique para tráfico de influência — mas temo que seja apenas dor de cotovelo: quem não gostaria de vender por uma fortuna, sem nunca ter sido consultor de coisa alguma, informações econômicas triviais, sem nenhuma expertise, a megaempresas e poderosas federações, que já gastam milhões com consultorias próprias muito mais abalizadas? Palocci adorou a experiência – e só fechou a torneira de ouro porque ser chefe da Casa Civil era ainda melhor. Mas –- mérito dele — Palocci nunca vazou ou deixou vazar os destinatários de sua consultoria secreta. Quem quiser, que especule até hoje sobre a natureza de seus serviços e a identidade dos contratantes. Pimentel deu azar: não conseguiu o mesmo grau de clandestinidade para sua pródiga clientela.

E eis que emerge, da lista de fregueses da P-21, um case que deve passar a integrar os manuais de consultoria empresarial como a mais extraordinária demonstração de incompetência simbiótica entre contratante e contratado. A ETA Bebidas do Nordeste, microempresa com sede em Paulista, Pernambuco, pagou a Fernando Pimentel 130 mil reais, ou 10 meses do que viria a ser seu salário líquido de ministro, por “prestação de serviços de análise econômico-financeira e mercadológica de seu plano de investimentos”. O pomposo nome do serviço parece justificar a polpuda remuneração, não fosse um detalhe: a ETA tem como único produto um refresco de guaraná chamado Guaraeta, vendido em copo de plástico, cujo lema é “naturalmente porreta”. Repetindo: o Guaraeta não chega nem a ter o status de um prosaico guaraná — é um refresco vendido em copo de papel, com menos extrato, mais água, mais açúcar. É bebida barata, consumida nas classes C e D de parte do nordeste, a menos de um real por unidade. Menos que uma tubaína. A ETA, por certo, é uma empresa modestíssima, paroquial – o que poderia querer de Pimentel em troca de 130 mil reais, como informa a nota fiscal em poder do ministro? Por que diabos uma empresinha da Região Metropolitana do Recife investiria uma vez e meia seu melhor faturamento mensal na “análise econômico-financeira e mercadológica” do segmento regional de refrescos feita por um ex-prefeito de Belo Horizonte?

Pois é, nem a ETA sabe a resposta. No começo desta semana, quando o escândalo veio à tona, Roberto Ribeiro Dias, um dos sócios da empresa na época em que o serviço teria sido contratado, tomou uma dose reforçada de legítimo extrato de guaraná com ginseng e nem assim lembrou-se de ter contratado o fabuloso consultor, por essa fabulosa quantia, para aprender o que quer que seja. No dia seguinte, já dentro do natural processo de blindagem do ministro, o atual administrador da empresa, Ricardo Pontes, desmentiu Dias – confirmando a consultoria e o valor pago por ela. Mas não disse uma palavra sobre o que realmente importa: a ETA ficou mais “porreta” depois de contratar Pimentel? Os 130 mil reais, dinheiro suado da empresa, foram devidamente multiplicados depois que Pimentel fez o serviço?

Não, um duplo não. O plano de negócios vendido pelo ministro não foi um refresco para a empresa em dificuldades: como por encanto, desde então as atividades da empresa foram sendo reduzidas, até a ETA ser vendida a Ricardo Pontes, no início deste ano. Hoje a ETA está instalada num galpão numa rua discreta e sem saída de Paulista, negativa e inoperante – ao contrário de Fernando Pimentel, positivo e operante.

O lulopetismo, que já demonstrou enorme expertise em todas as modalidades conhecidas de negócios suspeitos, descobriu novo filão, substituindo como itens à venda as obras que não faz pelo saber que não tem. O segmento mais promissor desse mercado é o superfaturamento de bens imateriais, como “consultoria” e “capacitação”. Cem por cento de lucro. Nenhuma despesa.

Fernando Pimentel, com sua sonda P-21, é o homem certo no lugar certo: a pasta do Desenvolvimento tem muito a ganhar com alguém que vende tubaína pelo preço de champagne, graças a uma fórmula ainda mais secreta que a da Coca-Cola.

Celso Arnaldo Araújo

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