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No princípio - a coisa começou a pegar no final de 2003 -, eram fragmentos de pernas amputadas, pulmões carbonizados, gengivas carcomidas, fetos em vidro de maionese, horrores atribuídos ao cigarro que a guerra contra os fumantes expôs na propaganda oficial como uma Guernica antitabagista. Cinco anos depois, muito provavelmente porque não há registro de fumante que deixou de sê-lo por causa da imagem gravada no maço que carrega no bolso, o Ministério da Saúde resolveu radicalizar o combate.
Seremos agora bombardeados com portraits de cadáveres necropsiados, fetos apodrecidos misturados a bitucas, faces necrosadas, jovens escornados, corações feitos de cinzeiro e - o que faz o mais célebre quadro de Picasso parecer ilustração de livro infantil -, a visão surrealista de uma cabeça arrebentada a golpes de machado para ilustrar o risco de derrame cerebral em fumantes. Parece sacrilégio se chocar com essas coisas no embalo do Dia Mundial Sem Tabaco, comemorado ontem, mas falo com a consciência tranqüila dos não-fumantes de bem com a vida.
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Pela lógica do raciocínio antitabagista, toda embalagem de McLanche Feliz seria decorada com tenebrosas imagens de carótidas e coronárias entupidas de gordura gosmenta e amarelada. Os carros sairiam de fábrica com respingos de sangue no painel e no estofado para lembrar o risco de traumatismo craniano e afundamento de tórax ao volante. As bolachas que contabilizam o consumo de chope nos bares chegariam à mesa do freguês ilustradas com detalhes da ressonância magnética de um fígado destruído pela cirrose. Imagino que a imagem dê bem a idéia do que a bebida é capaz.
Talvez seja mesmo conveniente alertar a população para toda sorte de riscos que corremos diariamente. Por exemplo: praticar esportes pode causar estiramento muscular; respirar em São Paulo é uma temeridade - mergulhar no Rio de Janeiro, outra; o trabalho estressa; roubar pode dar cadeia; andar na rua é se expor à violência, viajar de avião é coisa de quem não tem amor à vida... Para cada uma dessas advertências é possível produzir uma infinidade de imagens assustadoras.
Por que, então, reservar aos fumantes a exclusividade do tratamento de choque? Não conheço um só amante do cigarro que não faça de tudo para interromper essa relação avassaladora que o consome. Não existe tabagista que se gabe do apego à nicotina. Essa gente não precisa de susto. Tenham, pois, piedade do pessoal.
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Tutty Vasques - O Estado de S.Paulo
Berenice,
ResponderExcluirA campanha nais séria contra o tabagismo seria fechar as fabricas,mas com 70% de impostos embutidos,parece que preferem marginalizar apenas,pois isso incentiva a curiosidade, e consequentemente o consumo,preferem dar status de bandido aos fumantes enquanto dão status de heroi a sequestrador,Eita Brasil!!!!
Um forte abraço,amiga.
Ps:O Serra enxergou um filão da sociedade que é suscetível á essa idéia e parece que esqueceu que tem que prender são os bandidos e não os fumantes.Está sugerindo uma lei que proíbe fumantes em todo lugar,bandido pode,fumante não!